quinta-feira, 27 de março de 2008

81 Ancião Sagata e a Naga




81
    “Nós bebemos...etc.”- Esta história foi contada pelo Mestre sobre o Ancião Sāgata enquanto este morava no parque Ghosita perto de Kosambi.

Pois, depois de passar a estação das chuvas em Sāvatthi, o Mestre veio em peregrinação à cidade de comerciantes chamada Bhaddavatikā, onde pastores de cabras e bois e fazendeiros e andarilhos respectivamente imploravam para que não descesse à Estação de barcas da Mangueira; “pois,” eles disseram, “na Estação de barcas da Mangueira, nos domínios dos ascetas nus, mora uma venenosa e mortal Nāga, conhecida como a Nāga da Estação de barcas da Mangueira, que poderia ferir o Abençoado.” Fingindo não ter os escutado, apesar deles terem repetido o aviso três vezes, o Abençoado seguiu seu caminho.

 Quando o Bento estava morando perto de Bhaddavatikā numa certa gruta de lá, o Ancião Sāgata, um servidor do Buddha, que ganhou tantos poderes sobrenaturais como pode uma pessoa do mundo, foi para aqueles domínios, empilhou uma cama de folhas no lugar em que o rei-Nāga morava, e sentou-se lá de pernas cruzadas. Sendo incapaz de esconder sua natureza má, a Nāga fez muita fumaça. O mesmo fez o Ancião. Então a Nāga soltou chamas. Também soltou o Ancião. Mas, enquanto as chamas da Nāga não machucavam o Ancião, as chamas do Ancião machucavam a Nāga, e assim em pouco tempo ele dominou o rei-Nāga e estabeleceu-o nos Refúgios e nos Mandamentos, depois do que ele voltou ao Mestre. E o Mestre, após morar o quanto quis em Bhaddavatikā, foi para Kosambi. Bem, a história da conversão da Nāga por Sāgata, repercutiu largamente por todo o país, e o povo camponês de Kosambi saiu para encontrar o Abençoado e saudá-lo, depois passaram para o Ancião Sāgata e o saudaram também dizendo, “Diga-nos, senhor, o quê te falta e te forneceremos.” O Ancião permaneceu em silêncio; mas os seguidores dos Seis Sectários (cf. Jātaka 1) responderam assim: - “Senhores, àqueles que renunciaram o mundo, bebida destilada é tão rara quanto aceitável. Vocês acham que poderiam arranjar para o Ancião alguma boa bebida destilada (some clear white spirit) ?” “Com certeza podemos,” disseram os camponeses, e convidaram o Mestre para fazer sua refeição com eles no dia seguinte. Então eles voltaram para sua própria vila e arranjaram para que cada um em sua própria casa oferecesse boa bebida destilada para o Ancião, e conformemente todos fizeram estoque e convidaram o Ancião e encheram-no de bebida, de casa em casa. Tão funda foram suas libações que, no seu caminho para fora da vila, o Ancião caiu prostrado no portão e lá deitou soluçando sem sentidos. No seu caminho de volta de alimentar-se na vila, o Mestre encontrou o Ancião deitado neste estado, e pediu que os Irmãos carregassem Sāgata para casa, e seguiram caminho para o parque. Os Irmãos deitaram o Ancião com sua cabeça voltada para os pés do Buddha mas ele girou de modo que passou a dormir com os pés voltados para o Buddha. Então o Mestre fez sua pergunta, “Irmãos, Sāgata mostra agora o mesmo respeito por mim agora que mostrou antes?” “Não, senhor.” “Diga-me, Irmãos, quem dominou o rei-Nāga da Estação de barcas da Mangueira ?” “Foi Sāgata, senhor.” “Vocês acham que Sāgata no seu estado presente pode dominar mesmo uma cobra-d’água inofensiva ?” “Não poderia, senhor.” “Diga-me, então, Irmãos, é apropriado beber tanto que quando bêbado perca-se os sentidos ?” “É impróprio, senhor.” Bem, após discursar aos Irmãos em censura ao Ancião, o Abençoado determinou como preceito que beber intoxicantes é ofensa que requer confissão e absolvição; após o quê ele levantou-se e passou para seu quarto perfumado.

Reunindo-se no Salão da Verdade, os Irmãos discutiram o pecado de beber destilado, dizendo, “Que grande pecado é beber destilado, senhores, vendo que cegou a excelência de Buddha mesmo alguém tão sábio e dotado como Sāgata.” Entrando no Salão da Verdade neste momento, o Mestre perguntou qual o tema da discussão ; e disseram a ele. “Irmãos,” ele disse, “esta não é a primeira vez que aqueles que renunciaram o mundo perderam seus sentidos por causa da bebida ; a mesma coisa aconteceu em dias idos.” E assim falando, ele contou esta história do passado.

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Certa vez quando Brahmadatra reinava em Benares, o Bodhisatva nasceu em uma família-brahmin do norte em Kāsi; e quando cresceu, ele renunciou ao mundo pela vida de eremita. E ele ganhou os mais Altos Conhecimentos e Consecuções, e morava no gozo da benção do Insight nos Himālaias, com quinhentos pupilos ao seu redor. Uma vez, quando as estações das chuvas veio, seus pupilos disseram a ele, “Mestre, podemos ir para os domínios das pessoas e voltar com sal e vinagre ?” “Por mim, senhores, permaneço aqui ; mas vocês podem ir onde quiserem, e voltem quando a estação das chuvas acabar.”

Muito bem,” eles disseram, e tomando respeitável licença com o mestre, vieram para Benares, onde tomaram domicílio no jardim real. De manhã saíram na coleta de oferta na vila justo fora dos portões, onde conseguiram muito para comer; e dia seguinte eles continuaram seu caminho para dentro da cidade mesma. Os gentis cidadãos deram-lhes ofertas, e o rei logo foi informado que quinhentos eremitas dos Himālaias tomaram residência no jardim real, e que eram ascetas de grande austeridade, dominando, a carne, e de grandes virtudes. 

Escutando sobre o bom caráter deles, o rei foi para o jardim e com graça deu boas-vindas para eles ficarem lá por quatro meses. Eles prometeram que ficariam, e daí em diante foram alimentados no palácio real e abrigados no jardim. Mas um dia um festival de bebida foi dado na cidade, e o rei forneceu aos quinhentos eremitas um largo suprimento das melhores bebidas, sabendo que tais coisas raramente chegam no caminho daqueles que renunciam ao mundo e as suas vaidades. Os ascetas beberam as bebidas e voltaram para o jardim. Lá, em hilária bebedeira, alguns dançaram, alguns cantaram, enquanto outros, cansados de dançarem e cantarem, rodaram em volta das cestas de arroz e outros pertences – e juntos deles deitaram para dormir. Quando já tinham dormido da bebedeira e levantaram para ver os traços (rastros, ‘raspas e restos’) da folia, choraram e se lamentaram dizendo, “Fizemos o quê não devia ser feito. Fizemos este erro por estarmos longe de nosso mestre.” Daí eles deixaram o jardim e retornaram para os Himālaias. Deixando de lado suas tigelas e pertences, saudaram seu mestre e sentaram. “Bem, meus filhos,” ele disse, “passaram bem nos domínios dos seres humanos, e cederam cansativas jornadas na coleta de oferta ? Habitaram em unidade, um com outro ?”

Sim, mestre, ficamos confortáveis; mas bebemos bebida proibida, de modo que, perdendo os sentidos e esquecendo quem éramos, dançamos e cantamos.” E para esclarecer a matéria, compuseram e repetiram esta estrofe:-

Bebemos, dançamos, cantamos, exsudamos ; ainda  bem
Que, enquanto bebemos a bebida que rouba
Os sentidos, não nos transformamos em macacos.

Isto é o quê com certeza acontece àqueles que não estão vivendo aos cuidados de um mestre,” disse o Bodhisatva, censurando aqueles ascetas; e os exortou dizendo, “De agora em diante, não façam novamente tal coisa.” Vivendo com Insight inquebrável, ele tornou-se destinado a renascer depois no Reino de Brahma.

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Sua lição terminada, o Mestre identificou o Jātaka (e de agora em diante omitiremos as palavras ‘mostrou a conexão’), dizendo,- “Meus discípulos eram o bando de eremitas daqueles dias, e eu o professor deles.”






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