sexta-feira, 28 de outubro de 2016

[ n. do tr.: Simão = Vishnu ]



                       Plutarco Védico   isbn 978-85-906438-0-7

Simão = Vishnu

Plutarco em suas Vidas Paralelas é largamente citado pelos historiadores mostrando o paralelismo indoeuropeu, de imagens, acontecimentos, fatos, que são ocidentais e orientais, com o ritual do campo de Kurukshetra repetindo-se vedicamente por todo o mundo. Segue o paralelismo entre Vishnu e Simão primeiro na excelência e depois na morte e numa terceira citação em seguida. Por fim os famosos três passos de Vishnu, o som primordial mesmo com suas três letras, AUM, OM, tem seu equivalente na vida de Simão. Os três passos lembram que há um caminho, estrada, via. 


Satapatha Brahmana XIV, 1,1

1. “Os deuses Agni, Indra, Soma, Makha, Vishnu e Todos os Deuses, exceto os dois Asvins, realizam uma sessão sacrifical.

2. O lugar deles para veneração divina era Kurukshetra. Daí o Povo dizer que Kurukshetra é o lugar dos deuses, de veneração divina : daí onde quer que em Kurukshetra alguém se estabeleça, pensa, ‘Este é um lugar de veneração divina’; pois foi o lugar dos deuses para veneração divina.

3. Eles estavam sentados pensando, ‘Possamos atingir excelência ! Possamos tornar-nos gloriosos ! Possamos tornar-nos comedores de comida !’ E do mesmo modo as pessoas atualmente sentam pensando, ‘ ‘Possamos atingir excelência ! Possamos tornar-nos gloriosos ! Possamos tornar-nos comedores de comida !’

4. Eles falaram, ‘Quem quer de nós que, através da austeridade, fervor, fé, sacrifício e oblações, circundar o fim do sacrifício, será o mais excelente de nós e estará no meio de todos nós.’ ‘Assim seja,’ eles disseram.

5. Vishnu primeiro o atingiu e tornou-se a mais excelente dos deuses ; daí as pessoas dizerem, ‘Vishnu é o mais excelente dos deuses.’

6. Agora aquele que é este Vishnu é o sacrifício : e aquele que é este sacrifício é aditya distante ( o Sol ). Mais, realmente, Vishnu foi incapaz de controlar aquela glória dele ; e mesmo agora nem todos controlam sua glória.

7. Pegando seu arco, junto com três flechas, deu um passo. Permaneceu, descansando sua cabeça na extremidade do arco. Sem ousarem atacá-lo, os deuses sentaram ao redor dele.

8. Então as formigas disseram – estas formigas sem dúvida eram do tipo upadika ( n. do tr. : isto é, uma certa espécie de formiga que supõe-se encontra água onde quer que cave. ) - ‘O que daremos àquele que roer a corda do arco ?’ -’Daremos prazer do alimento e ele encontraria água mesmo no deserto : assim daremos todo prazer do alimento.’ - ‘Assim seja,’ elas disseram.

9. Tendo ido bem para debaixo dele, elas roeram sua corda de arco. Quando cortou, a extremidade saltando separada, cortou fora a cabeça de Vishnu.

10. Ela caiu com ( o som ) ‘ghrin’ ; e caindo tornou-se o Sol distante. E o resto ( do corpo ) estirado deitado com a parte de cima para o leste. E porquanto caía com ( o som ) ‘ghrin’, Gharma ( foi chamado ) ; e porque ficou estirado ( pra-vrig ) daí Pravargya ( toma seu nome ) ( n. do tr. : isto é, o gole, copo, de leite quente )”.

Plutarco, Vida de Simão ( Cimón )

VIII. “… pareceu excessiva a honra que se prestou ao nome de Simão, por que nem Temístocles nem Milcíades alcançaram tanto … por que então estimavam tanto as façanhas de Simão : não seria por acaso porque os outros dois caudilhos só trataram de rechaçar os inimigos para não ser por eles subjugados e debaixo do mando deste puderam ofendê-los e fazendo-lhes a guerra em seu próprio país adquiriram possessões e estabeleceram colônias … estabeleceram-se também em Sciro tomando-a Simão … Sabedor que ali o antigo Teseu, filho de Egeu, fugindo de Atenas, havia sido traidoramente morto pelo rei Licomedes, fez diligência para descobrir seu sepulcro, porque tinham os atenienses um oráculo que mandava se trouxessem para a cidade os restos de Teseu e o venerassem devidamente como a um herói ; porém ignoravam onde jazia porque os scirenses não mostravam e não deixavam averiguar. Encontrando pois então a cova, a força da mais extraordinária diligência, pôs Simão os ossos em sua nave e, adornando-lhes com esmero, os conduziu para a cidade depois de uns oitocentos anos, com o quê lhe estimou ainda mais o Povo. Em memória deste sucesso se celebrou uma contenda de trágicos que se fez célebre porque tendo apresentado Sófocles, que ainda era jovem, seu primeiro ensaio, como o arconte Apsefión, devido a brigas e e altercações entre os espectadores, não tinha sorteado os juízes da contenda, quando Simão se apresentou com seus colegas no teatro para fazer ao deus as libações prescritas pela lei, não os deixou sair mas tomando-lhes juramento os fez sentar e julgar sendo dez o número um de cada tribo ; assim esta contenda se fez muito mais importante pelo dignidade mesma dos juízes. Venceu Sófocles e se diz que Ésquilo sentiu tanto e o levou com pouco comedimento que não foi mais muito o tempo que viveu em Atenas, tendo-se mudado, por aquele desgosto, para a Sicília onde morreu e foi enterrado nas imediações de Gela”.

XVIII “… Quando tudo estava arrumado e as tropas já embarcadas, teve Simão um sonho. Apareceu uma cadela muito furiosa que ladrava para ele e do ladrido saía uma mistura de voz humana que dizia :
Aproxima-te, porque hás de ser amigo
meu e destes meus ternos cachorrinhos.
Sendo difícil e obscura esta visão, Astífilo de Posidonia, que era adivinho e muito conhecido de Simão, disse que aquilo significava sua morte, explicando-lhe desta maneira : O cachorro é o inimigo daquele a quem ladra e de um inimigo nunca se faz um melhor amigo que na morte ; a mistura da voz designa um inimigo medo ( da Média ), porque o exército dos medos se compõe de gregos e bárbaros. Depois deste sonho, estando ele mesmo sacrificando a Baco, dividiu o sacerdote a vítima e o sangue coagulado foram levando pouco a pouco umas formigas e colocando junto ao dedão do pé de Simão, sem que ele percebesse por algum tempo ; porém, exatamente quando viu, veio o sacerdote mostrando-lhe o fígado sem cabeça. Contudo não podendo cancelar a expedição seguiu adiante e enviando sessenta naves ao Egito navegou com todas as demais. Venceu a armada do rei … Preparados assim por Simão os princípios de grandes combates e mantendo-se com sua esquadra nas mediações de Chipre,enviou mensageiros ao templo de Amon, a inquirir do deus certo oráculo obscuro ; pois ninguém sabe ao certo para que foram enviados. Nem tampouco o deus lhes deu oráculo algum mas no momento de aproximarem-se mandou que regressassem os da consulta pois tinha já consigo a Simão. Escutando isto os mensageiros baixaram ao mar e quando chegaram ao campo dos gregos, que estava no Egito, souberam que Simão estava morto e contando os dias que passaram próximo ao oráculo reconheceram ter acontecido a morte do caudilho com o dizer que já estava com os deuses.”

Segue a comparação : os Asvins são os Gêmeos.

Satapatha Brahmana XIV, I, 18 s

18. “Bem, Dadhyañk Atharvana conhecia esta pura essência, este Sacrifício, - como esta cabeça do Sacrifício é colocada novamente, como este Sacrifício torna-se completo.

19. Ele então escutou de Indra, ‘Se você ensinar este ( mistério sacrifical ) para alguém, cortarei fora tua cabeça.’

20. Bem, os Asvins escutaram isto, -’Verdadeiramente Dadhyañk Atharvana conhece esta pura essência, este Sacrifício, - como esta cabeça do Sacrifício é colocada de novo, como este Sacrifício torna-se completo.’

21. Eles foram até ele e disseram, ‘Nós dois vamos nos tornar teus pupilos.’ -’O que vocês desejam aprender ?’ ele perguntou. - ‘Esta essência pura, este Sacrifício, - como esta cabeça da Sacrifício é colocada novamente, como este Sacrifício torna-se completo,’ eles responderam.

22. Ele disse, ‘Indra me falou dizendo, ‘Se você ensinar isto para alguém, cortarei fora tua cabeça;’ portanto temo que ele realmente corte fora minha cabeça : não posso aceitar vocês de pupilos.’.

23. Eles disseram, ‘Nós protegemos você dele.’ - ‘Como vocês me protegeriam ?’ ele respondeu. - Eles disseram, ‘Quando você nos tiver recebido como pupilos, ós cortaremos fora tua cabeça e guardamos em algum lugar ; então buscamos uma cabeça de cavalo e a colocamos em você : como esta você nos ensinará ; e quando você tiver nos ensinado, então Indra cortará fora aquela cabeça tua ; e nós buscaremos tua própria cabeça e a colocaremos em você novamente.’ - ‘Assim seja,’ ele respondeu.

24. Ele então os recebeu (como seus pupilos ); e quando ele os tinha recebido, eles cortaram fora a cabeça dele e a guardaram em um lugar ; e buscando a cabeça do cavalo, eles a colocaram nele : com esta ele os ensinou ; e quando ele os tinha ensinado, Indra cortou fora aquela cabeça dele ; e tendo buscado sua própria cabeça, eles a colocaram nele novamente.

25. Portanto é relativo a isto que o Rishi disse ( Rig V, I, 116,12 ), ‘aquele Dadhyañk Atharvana, com uma cabeça de cavalo, de qualquer modo transmitiu para vocês dois a doce doutrina :’ - ‘Irrestritamente ele transmitiu isto,’ é o quê isto significa.”


Plutarco, Vida de Simão

XVI. “Foi desde o princípio partidário de Lacedemônia e de dois filhos gêmeos que teve de Clítor, segundo diz Estesímbroto, a um pôs o nome de Lacedemônio e a outro Eleo, pelo que Péricles muitas vez lhe jogou na cara sua origem materna ; … Contribuíram muito com seus adiantamentos os lacedemônios, que já então estavam em contradição com Péricles e queriam este jovem com mais poder e autoridade em Atenas. Isto viram ao princípio com gosto os atenienses, não tirando pouco partido da benevolência dos lacedemônios para com ele ; porque no começo do seu crescimento e quando começavam a tomar parte nos assuntos dos outros povos aliados uns dos outros, não lhes viam mal as honras e obséquios feitos a Simão, posto que entre os gregos tudo se manejava a seu arbítrio, sendo afável com os aliados e muito aceito pelos lacedemônios. Mas depois quando já se fizeram os mais poderosos viram com maus olhos que Simão permanecesse contudo, não ligeiramente apaixonado pelos lacedemônios ; porque ele mesmo também celebrando para tudo os lacedemônios antes dos atenienses, especialmente quando tinha que repreendera estes ou exitá-los para alguma coisa, tomou o costume, segundo se refere Estesímbroto, de dizer-lhes : “Poucos são assim os lacedemônios !” Com o quê granjeou certo ciúme e desprezo de parte de seus concidadãos. Porém de todas a calúnia mais poderosa contra ele teve esta origem : No ano quarto do reinado de Arquidamo, filho de Zeuxidamo, em Esparta, devido a um terremoto maior que todos aqueles de que antes havia memória, em todo o território dos lacedemônios se abriram muitas brechas e estremeceu o Taigeto, alguns de seus montes se aplanaram. A cidade mesma tremeu toda e fora cinco casas, todas as demais derrubou o terremoto. No pórtico, na ocasião estava cheio, exercitando-se nele um tempo os moços e jovens, se diz que pouco antes do tremor apareceu uma lebre e que os jovens, ungidos como estavam pela moçada, se puseram a correr atrás dela e a persegui-la e enquanto isso caiu o ginásio sobre os moços que haviam ficado, morrendo ali todos ; a seu sepulcro ainda se dá atualmente o nome de Sismatia, devido ao terremoto. Previu logo Arquidamo o que ia acontecer e vendo que os cidadãos se dedicavam a recolher de suas casas o mais precioso, mandou que a trombeta fizesse sinal de que vinham inimigos para que a toda pressa acudissem armados a sua presença. Isto só foi então o quê salvou Esparta porque de todos os campos vieram correndo os ilotas para acabar com os que se salvaram dos espartanos ; porém estando em ordem de batalha se retiraram para seus povoamentos sendo contudo bem claro que iam fazer-lhes guerra por terem atraído não poucos vizinhos e vir já também contra Esparta os messênios. Enviam pois os lacedemônios para Atenas de embaixador, para pedir auxílio, a Periclidas, de quem disse comicamente Aristófanes que “sentado diante dos altares, todo pálido, com uma roupa púrpura, pedia por compaixão um exército.” Opunha-se Efialtes e com o maior empenho rogava que se negasse socorro e não se restabelecesse uma cidade rival de Atenas mas que se a deixasse no solo para ser pisado seu orgulho ; porém disse Crítias que Simão, antepondo o bem dos lacedemônios ao crescimento de sua pátria convenceu ao Povo e saiu para auxiliá-los com muita infantaria. Ion nos conta que a principal razão com que moveu os atenienses, foi exortá-los a que não deixassem cocha a Grécia nem que a cidade ficasse sem parelha”.

Antes de tudo se Simão = Vishnu, Péricles = Indra e Aristides = Agni
Plutarco, Vida de Péricles
VIII “… ainda que se diga quedos primores com que adornou a cidade e outros que de sua autoridade no governo e nos exércitos, lhe veio que o chamassem Olímpio : bem que nada de estranho havia que todas estas coisas houvessem contribuído naquele homem insigne a gloriosa denominação. Mas as comédias contemporâneas lançaram então muitas vozes sérias ou ridículas contra ele ; de seu modo de falar mostram haver originado principalmente o tal apelido porque diziam dele que trovejava, que lançava centelhas e que levava na língua um raio tremendo quando falava em público”.

Plutarco, Vida de Aristides
XX. “Depois destes sucessos não concordavam os atenienses em conceder a honra de valor aos lacedemônios, nem lhes permitiam levantar troféus, estando por muito pouco que de repente se arruinasse toda aquela felicidade dos gregos, estando como estavam sobre as armas, não fora Aristides, exortando e persuadindo a seus colegas, especialmente Leócrates e Mirônides, alcançou e obteve deles que se deixasse a decisão para os outros gregos ( da Anfictionia delphica cujas pernas , irmãos gêmeos, são as duas cidades maiores ). Deliberando pois estes propôs Teógiton de Megara que a honra de valor deveria se dar a outra cidade se não se queria que incendiasse uma guerra civil e como com esta proposta se pôs de pé Cleócrito de Corinto, logo fez crer que ia pedir o prêmio para os coríntios porque depois de Esparta e Atenas era Corinto uma da cidades de mais fama ; mas fez a favor de Platea uma admirável proposta que agrado a todos porque aconselhou para acabar com a disputa se desse a honra de valor para os plateenses com cuja preferência ninguém se incomodaria ; assim foi que prontamente outorgou Aristides para os atenienses e em seguida Pausanias para os lacedemônios. Reconciliados deste modo, separaram do botim oitenta talentos para os de Platea com os quais reedificaram o templo de Minerva, lavraram sua estátua e adornaram o templo com pinturas que ainda no dia de hoje se conservam frescas. Levantaram troféus separadamente : de uma parte os lacedemônios e de outra os atenienses ; porém quanto a sacrifícios, havendo consultado Apolo Pítio lhes deu em resposta que construíssem a ara de Júpiter ( Diu-pater ) Libertador e que se abstivessem de sacrificar até que, apagado o fogo de todo o país, como contaminado pelos bárbaros, o acendessem puro no altar comum de Delphos ( a anfictionia delphica propriamente com o nome das 31 cidades escritos na coluna da trípode ). Os magistrados pois dos gregos enviaram de Povo em Povo, para que todas as casas apagassem os fogos e em Platea tendo se oferecido Euquidas para ir com toda a diligência pegar e trazer o fogo de Deus, marchou para Delphos. Lá lavou o corpo, fez aspersões, corou-se de louros e tomando da ara o fogo foi correndo para Platea e chegou antes do pôr do Sol, tendo andado naquele dia mil estádios. Saudou a seus concidadãos e imediatamente caiu ao solo e daí há pouco expirou. Recolheram os de Platea seu cadáver e o sepultaram no Templo de Diana Euclia pondo por inscrição este tetrâmetro
De Sol a Sol Euquidas correndo
Foi e veio de Delphos em um mesmo dia.
E o sobrenome de Euclia dão a Diana porém alguns dizem que Euclia foi filha de Hércules e Mirtis, filha de Menécio e irmã de Pátroclo que tendo morrido donzela é tida em veneração pelos beócios e os larcos porque sua ara e sua estátua se vêm colocadas em todas as praças e fazem sacrifícios as noivas e noivos”.


O ritual em Kurukshetra repete-se então.

A cabeça da Lebre e a cabeça do Cavalo pode se comparar ? Primeiramente o artigo de Ananda Coomaraswamy, Sobre lebres e sonhos in ‘What’s civilization ?’, Ed. Golgonooza, Ipswich, 1989, confirma a hipótese : olhando o Jataka 316 em que a Lebre lança-se ao fogo do sacrifício em oferta e a frase de Arato, Phainomena, epígrafe do artigo, que lembra o movimento astronômico das constelações da Lebre e do Cão : ‘a Lebre a quem o Cão persegue, numa corrida sem fim’ : ela entra no jardim do hortelão para pegar a comida da vida mas o cão a vê e corre atrás dela e a corrida tem seu desfecho na porta estreita em que a lebre perde o rabo mas escapa em novo nascimento com o alimento sagrado: o mesmo que no galinheiro a raposa gorda fica presa depois de comer três dias : ‘estreita é a porta, apertado o caminho.’ Segue um trecho deste artigo em que Coomaraswamy comenta o livro do dr. Layard, The lady of the hare, Faber & Faber, London, 1945 :

“ Tivesse Dr. Layard conhecido o importante trabalho de Karl von Spiess, no ´Die Hasenjagd´ publicado em ´Marksteine des Volkskunt, i.e. o Jahrbuch fur historiche Volkskunde, V, VI, Bd. 1937, pp 243 - 267, ele poderia ter penetrado ainda mais profundamente o significado da Lebre. Mais especialmente em conexão com os contrários, os pares de opostos, os quais ele discute nas páginas 46 a 69 e alude em algum outro lugar. Porque o simbolismo da Lebre está muito estreitamente relacionado com o das Simplegades1, um motivo arquetípico que se distribui por todo mundo notadamente Americano, Céltico e Hindu assim como Grego. Já a muito se reconhece que as Simplegades, ou as `Rochas que batem´, são os batentes da Janua Caeli a Porta do Sol e porta do Mundo do Chandogya (VIII.6,5,6) e Maitri (VI.30) Up. onde estes portões são uma entrada para o sábio mas uma barreira para o tolo. Nas palavras de Karl von Spiess, “Além das ´Pedras que batem´ no Outro mundo está a Maravilha da Beleza, a Planta e a Água da Vida”, e naquelas de Whitman ‘tudo espera, não sonhado naquela região, aquela terra inacessível’ uma terra da qual ´não há retorno´ por qualquer necessidade ou operação de causas mediatas (ananke, karma) mas somente como ‘Os que se movem na vontade’ (kamacarin) .

Os batentes da porta, que também é a auto-operada, automática Mandíbula da Morte, são os pares de opostos, ou contrários (enantia, dvandvau) aos quais nossos gostos nos atrai e dos quais nossos desgostos nos repele e da tirania de quem o peregrino busca escapar (dvandvair vimuktah sukhaduhkhair-sanjñai gaccanti padam avyayam, Bhagavad Gita, XV. 5 ). É destes contrários, como Nicolas de Cusa disse, que a parede do Paraíso é construída; quem quer que entre deve passar pelos batentes do altíssimo espírito da razão (‘Eu sou a porta das ovelhas; por mim ...’), quer dizer entre as Rochas que Batem, pois nas palavras dos Upanishads, ‘não há entrada lateral aqui no mundo’. Daí porque também tantos ritos são realizados ‘dawn and dusk’ no amanhecer ou no entardecer ‘quando não é nem noite nem dia’, e por meios que são não descritivos, por exemplo ‘nem úmido nem seco’. É de fato, deste ponto de vista apenas, que pode ser entendido porque a palavra Indiana para theosis, deificação (brahma-bhuti, literalmente ‘tornando-se Brahma’; no Budismo, sinônimo do atingir o estado de Buda, o estado de ‘amplamente desperto’) é também denotação de crepúsculo (samadhi, literalmente ´síntese´, ou estado de estar ‘em samadhi). O perigo de ser esmagado pelos contrários, novamente, é a razão de carregar-se a noiva pela soleira da nova casa, o Noivo correspondendo ao Psicopompo que leva a alma através da soleira do outro mundo onde ambos irão ´viver felizes para sempre´. O caminho é ´estreito´ realmente justo porque os contrários ´batem´, fazendo contato imediato e incessante. Por exemplo, se nós considerarmos os contrários passado e futuro , o caminho repousa evidentemente através do eterno agora sem duração, um momento do qual a experiência empírica é impossível e ela ‘não dá tempo’ no qual percebê-la; ou usando símbolos espaciais, o caminho repousa através do ponto não dimensional que separa todo aqui de lá, e ´não nos deixa lugar´ através do qual passar; ou se os termos são éticos, então o caminho é um que demanda espontaneidade e inocência transcendendo o ´conhecimento do bem e mal´ e que não pode ser definido em termos de valores de virtude e vício que se aplica a todo comportamento humano. Assim ele somente está qualificado a passar através do meio do Sol que virtualmente já passou; logicamente e humanamente falando o caminho é um impasse; e não é nenhuma maravilha que todas as tradições falem de um deus Guia, deus Porta e Psicopompo que leva ao caminho e abre as portas para aqueles que querem voluntariamente seguir.

Em todas as histórias daquelas, do termo folclórico ´Porta ativa´ seja Esquimó, Céltica ou Grega, encontramos aquela parte, a parte ´de trás´ , ou ´apêndice´ , da pessoa ou veículo, nave ou cavalo no qual a jornada é feita, é cortado fora é deixado para trás. Assim, no caso dos heróis Irlandeses, a portícula do Castelo Doutro mundo , cai tão rapidamente que corta as roupas e as esporas das costas do cavaleiro e derruba e divide seu cavalo do qual a parte de trás é perdida e já que o caminho para dentro é ambos o que é Imortal e Desconhecido , é claro que o que é cortado fora é a parte mortal do entrante, a pessoa conhecida ou personalidade que nunca foi, por que sempre foi trocando e nunca conheceu um agora ou escapado da teia lógica de alternativas polares.”

Henri Jeanmaire, “Couroi et Courètes, essai sur l’education spartiate et sur les rites d’adolescence dans l’antiquité hellénique”, Lille, France, 1934, também confirma a tese pois mostra porque o resgate dos ossos de Teseu é a realização de todo sacrifício e como por toda a Grécia há uma iniciação em que o mistagogo, o iniciador, tem cara de bicho posto que situado na Mãe Natureza, no deserto, na floresta, o lugar fora do mundo das pessoas, para-oikia ( paróquia, do lado-casa ) para onde são levados meninos e meninas, por quarenta dias, ou quinze, em penitência e arrependimento, antes de voltarem e se tornarem cidadãos plenos, iniciados. No ritual deste afastamento para o mundo selvagem repete-se uma disputa como a de IHS no deserto por 40 dias durante a Quaresma : ‘os demônios O espicaçavam e os anjos O protegiam’ onde aparece inclusive as três tentações da serpente do paraíso que desta vez não tem sucesso. As crianças, jovens, adolescentes, que vão se tornar adultos iniciados passam ritualmente por esta prova, literal, entre dois partidos, dois lados, duas forças. A comparação com a luta entre deuses e titãs se estabelece posto que argila, gesso, fuligem, cobre o rosto dos titãs que comungaram da carne de Dionisos salvo o coração : são fulminados pelo raio de Zeus e de suas cinzas são feitos os seres humanos. A esta luta original somos remetidos, transportados. Francis Vian mostra em sua obra esta luta entre deuses & titãs na arte greco-romana, tema amplamente difundido. Os espartanos armados em pleno terremoto esperando o inimigo, aproxima-se, enquanto cena, de Pausanias querendo iniciar a guerra em Platea com um sacrifício mas os lídios arrebatam a oferta, acontecimento descrito em Plutarco, Vida de Aristides, XVII “… estando Pausanias sacrificando e fazendo orações a pouca distância da formação, chegaram de repente alguns lídios com o objetivo de arrebatar as ofertas e não tendo armas Pausanias e os que o ajudavam, os afastaram com varas e chicotes e que agora em imitação daquela investida, se repetem todo ano os golpes e açoites que se dão nos jovens sobre a ara e a pompa da procissão dos lídios.” Cf também Plutarco, Vida de Simão, I, em que aparece pessoas com o rosto coberto de fuligem assaltando Queronea, sua cidade : o autor se remete a este, velho homem feito de argila e que disputa, assalta, luta, na existência, vida . No Satapatha Brahmana, que vemos está próximo em seu conteúdo, aparece muitas vezes este confronto original :

II, 2, 2, 8 s : “Bem os deuses e os Asuras, ambos brotaram de Prajapati, estavam brigando uns com os outros. Ambos eram desalmados pois eram mortais e o quê é mortal é desalmado. Entre estas duas classes de seres que eram mortais,Agni apenas era imortal ; e foi através dele, o imortal, que ambos viviam. Bem quem quer dos deuses que eles os asuras matassem, era realmente morto.
9. Com isto os deuses foram diminuindo. Eles seguiram rezando e praticando austeridades, esperando que pudessem ser capazes de vencer seus inimigos, os mortais asuras. Eles contemplavam este Agnyadheya ( fogo consagrado ) imortal.
10. Eles disseram, ‘Vamos, coloquemos este elemento imortal em nossa mais íntima alma ! Quando tivermos colocado o elemento imortal em nossa alma mais íntima e nos tornado imortais e invencíveis, venceremos nossos inimigos mortais’”.

I, 1, 2, 3 : “Pois os deuses quando estavam realizando o sacrifício, temiam perturbação da parte dos Asuras e Rakshas : daí por este meio ele os expele de lá, na abertura mesma do sacrifício, aos maus espíritos, os Rakshas.” Cf I, 1, 4, 16.

I, 8, 1, 16 : “Naquele tempo Manu tornou-se apreensivo pensando, ‘Esta parte do meu sacrifício – isto é, este idâ representando a oferta doméstica – é certamente a mais fraca : os Rakshas não devem danificar meu sacrifício neste lugar’. De acordo com isto ( a manteiga retirada do idâ e esfregada nos lábios ) ele a promoveu ( a idâ para um lugar seguro pensando ), ‘antes que os Rakshas venham ! Antes que os Rakshas venham !’” . Repete-se em seguida o refrão desta corrida.

III, 2, 1, 18 : “Bem, os deuses e os asuras ambos brotaram de Prajapati, entraram ambos na herança de seu pai Prajapati : os deuses receberam a Mente e os asuras a Fala. Com isto os deuses entraram no sacrifício e os asuras na fala ; os deuses lá ( no céu ) e os asuras aqui ( na terra ).” Como a Palavra é mulher os devas acabam por seduzi-la e levá-la para o sacrifício.

V, 1, 1, 1 : “Certa vez os deuses e os asuras ambos brotaram de Prajapati, brigavam entre si. E os asuras, arrogantes, pensavam, ‘Em quem devemos fazer ofertas ?’ continuaram ofertando para as próprias bocas. Eles nada alcançaram por causa da arrogância mesma : daí que ninguém seja arrogante pois arrogância é causa de ruína.
2. Mas os deuses continuaram fazendo ofertas uns para os outros. Prajapati ofertou ele mesmo para eles : assim o sacrifício tornou-se deles e realmente o sacrifício é a comida dos deuses.” Cf. V, 2, 4, 7 ; VI, 3, 1, 29 ; VI, 3, 3, 24s.

IX, 2, 3, 2 : “Naquele tempo, como os deuses estavam se aprontando para realizar este sacrifício, os asuras, inimigos traidores, tentaram atingi-los do sul, dizendo, ‘Vocês não sacrificarão ! Vocês não realizarão o sacrifício !’ … 8 : “Os deuses e os asuras ambos brotaram de Prajapati e estavam disputando as regiões e os deuses arrancaram as regiões dos asuras e no mesmo modo o sacrificante agora arranca estas regiões do seu rival odioso.” Paralelos ( // ) em 13 e 23 repetindo como um refrão.

IX, 5, 1, 12 : “Os deuses e os asuras, ambos brotaram de Prajapati receberam a herança de intelecto, fala – verdadeira e mentirosa, ambos verdade e mentira : ambos falavam a verdade e ambos falavam a inverdade ; e realmente, falando igual, eram iguais.
13. Os deuses abandonaram a inverdade e seguraram firme a verdade e os asuras abandonaram a verdade e seguraram firme a inverdade. …
19. Eles prepararam a oferta de iniciação. Mas os asuras tomaram conhecimento disto e disseram, ‘Tendo preparado o sacrifício, os deuses agora espalham a verdade : vamos pegar lá o quê é nosso !’ … Os deuses espiando os asuras retiraram o sacrifício e começaram a fazer outra coisa. Eles ( os asuras ) saíram fora pensando, ‘Eles estão fazendo outra coisa.’” Paralelos em 20, 21, 22, 23 como um refrão sendo que no última estrofe o sacrifício acontece e os asuras saltam para baixo, pulam para baixo : o tema do salto aparece largamente no livro Henri Jeanmaire posto que relato a estes rituais e especialmente a Egeu e Teseu.

IX, 5, 9, 3 : “Bem, os deuses e os asuras, ambos brotaram de Prajapati, estavam brigando – era pelo sacrifício mesmo, por Prajapati, que estavam brigando, dizendo, ‘Nosso ele será ! Nosso ele será !”

IX, 5, 5, 1 : “Bem quando os deuses estavam passando para cima para o mundo celeste, os Asuras envolveram-los em escuridão. Eles falaram, ‘Verdadeiramente por nada a não ser uma sessão sacrifical pode se dispersar esta escuridão : bem então realizemos uma sessão sacrifical !’”

III, 6, 3, 8 : “Então ofereceu a segunda oblação para o Ligeiro ( Pequeno Polegar ) com,’ Possa o Ligeiro graciosamente aceitar a manteiga, salve ! Pois ele falou naquele tempo, ‘Verdadeiramente, temo os rakshas : façam-me ser muito pequeno para seu dardo mortal, de modo que os maus espíritos não me machuquem no caminho ; e atravessando-me na forma de uma gota, pois a gota é ligeira.’ E concordemente, tendo-o feito muito pequeno para o dardo mortal , o levaram em segurança na forma de gota, por medo dos rakshas pois gota é ligeira : por isto ele oferece a segunda oblação para o ( Pequeno Polegar ) o Ligeiro.” Henri Jeanmaire em seu livro também fala largamente do Pequeno Polegar seja de Perrault, seja dos Grimm e aqui temos novamente uma referência que ajuda a entender e comprovar que ele estava certo ao relacionar o antigo ritual grego com esta história tradicional. O estar no útero, ou na barriga, é imagem também largamente presente no Satapatha Brahmana sendo que a antiga pele negra de antílope, no lugar de um tapete, é este principal lugar em que o ser humano é gerado, cresce e nasce : o lugar do sacrifício mesmo e do altar.

VI,3, 1, 29 : “Eles estavam no lado sul ; pois os deuses naquele tempo temiam que os rakshas os inimigos pudessem atingir o sacrifício no sul. Eles viram o raio, Sol longíquo ; pois esta cavalo é realmente o Sol distante ; e através do raio eles afastaram os rakshas, os inimigos do sul e espalharam este sacrifício em um lugar livre de perigo e maldade. …”. Enfim o raio.

A comparação pode continuar com os parágrafos de Plutarco referentes ao tempo de Saturno, Cronos, próprio da época de Simão e Aristides. O fato de Simão morar com a irmã Elpinice.

Enfim, quando IHS diz para a mulher siro fenícia “Mulher, grande é tua fé !” uma vez que a fé em questão fala de cachorrinhos que comem migalhas da mesa de seus senhores no caso Abrãao, Isaac e Jacó e os profetas não seriam os mesmos cachorrinhos do sonho de Simão ?


Charles Renel, L’évolution d’un mythe : Asvins et Dioscures, Lyon, 1896, encerra o assunto dando todas as respostas a respeito deste restabelecimento da cabeça do sacrifício pelos Asvins : a expressão litúrgica que Paul Regnaud, Les Premieres formes de la religion et de la tradition dans l’Inde et la Grece, Paris, 1894, tão bem explicitou e que Renel segue, foi, sabe-se lá por que cargas d’água, esquecida pela historiografia contemporânea. A contrariedade original mostra-se então com água fogo, libação chama, e claro prenúncio do carne sangue, pão vinho.   


Não poderiam faltar os famosos três passos de Vishnu referente a história de Vamana, Vishnu, criança, pequeno, humilde, mendicante, pedindo três passos de terra para Bali que na soberba da riqueza do seu sacrifício concede : com um passo toma a terra, com outro o céu e faltando espaço Bali não consegue cumprir o que prometera e Vishnu retoma a posse do céu entregando de volta a Indra sendo Bali expulso. Os Upanishads dissertam largamente sobre estes três passos aos quais o Satapatha Brahmana também se refere. Eles são o som original as três letras AUM, OM, representando os três mundos, terra, céu e a atmosfera no meio, e também aos três estados, vigília, sonho e sono profundo : corpo, psique, espírito. É próximo da shemah, ‘ouve...’, : ‘amarás o senhor teu deus de todo o teu coração, de toda tua alma e de todo teu espírito’ : a manifestação, o estado sutil e o não manifesto, o indiferenciado, o espírito. Mas claramente indicam uma vez que passos são que há um caminho, via, estrada.

Segue o parágrafo de Plutarco, Vida de Simão, XII e XIII em que alude a estes três passos e fala realmente que Simão seguia passo a passo ao grande rei, os persas, expulsando-os, os ‘bárbaros’, da grande Grécia n’Ásia. É nesta vitória sobre os persas em 470 a.C. que estes últimos, com a derrota, resolveram não se aproximar do mar e de barcos, da costa, a distância de uma corrida de cavalo :
Simão que como destro atleta em um dia em que havia saído vencedor em dois combates, não obstante ter excedido com a batalha campal o triunfo de Salamina e com a naval o de Platea ainda somou outro troféu a estas vitórias ; pois sabendo que as oitenta galeras fenícias, que não tiveram parte no combate, tinha aportado a Hidro, se dirigiu para lá sem detenção ; e como seus comandantes não tivessem notícia positiva das forças principais, mas estando em dúvida e na incerteza, sendo por isto maior a surpresa, perderam todas as naves e a maior parte do soldados pereceram. De tal modo abateram estes sucessos estes sucessos o ânimo do rei ( dos persas ), que combinou aquela paz tão afamada de não aproximar-se jamais do mar da Grécia a uma distância de uma corrida de cavalo e de não navegar dentro das ilhas Cianeas e Quelidônias com nave grande e de proa de bronze, ainda que Calístenes sustente que o bárbaro não fez tal tratado ; mas nas obras manteve o que se disse, devido ao medo daquela derrota, ficando a tanta distância da Grécia que Péricles com cinquenta galeras e Efialtes com apenas trinta, navegaram por aquela região das Quelidônias sem que os bárbaros oferecessem a vista nem sequer um barco. Cratero porém, em sua coleção de decretos, inseriu o tratado como tendo acontecido realmente e ainda se diz que os atenienses erigiram por motivo dele a ara da paz e que a Calias,que havia sido o embaixador, encheram de distinções. Vendidos os despojos que então se tomaram, teve o Povo fundos para muitas coisas e edificou o muro da cidadela que mira o Sul, tendo o Povo enriquecido com estas expedições. Soma-se a isto que as largas muralhas chamadas Pernas, ainda que foram terminadas depois, começaram então e que a fundação com houvesse encontrado terreno pantanoso e mole , foi firmada com toda a segurança por Simão que fez secar os pântanos com muita argila
e pedras muito pesadas, dando e aprontando para isto os bens necessários. Foi o primeiro a embelezar a cidade com estes lugares de recreio e entretenimento, pelos quais houve tanta paixão depois, porque plantou árvores na praça e na Academia que antes carecia de água e era um lugar inteiramente seco, deu-lhe um rego, rio, convertendo-a em um bosque e a adornou com corredores espaçosos e desembaraçados, e com passeios em que se gozava de sombra, sombreados.”

Plutarco em sua Vida de Teseu, XXXII, explica que Academo que dá nome a Academia posto que dono do terreno fora das muralhas, foi quem restituiu Helena, a filha de Dzeus, aos Dióscuros, seus irmãos gêmeos, como Clitemnestra mesma era gêmea dela ( nasceram de dois ovos de Cisne ), quando Teseu a raptou ainda criança. Ela ficou com Aetra a mãe de Teseu que a acompanhou, a ela Helena, até Tróia. A Academia, lugar da religião da philosophia, do amor, da sabedoria, que fez ressoar para a eternidade as falas de Sócrates, nos escritos de Platão, é apropriadamente a terceira conquista deste terceiro passo, espiritual e indiferenciado. Atendo ao lugar mesmo pensemos no ‘Fedro’ de Platão, no jardim do lado de fora da muralha da cidade de Atenas em que Fedro e Sócrates descalços ( lembra-se então que Sócrates sempre estava descalço ) como em solo sagrado conversam e discutem sobre a Palinodia (palin-ode, ao contrário / inverso/ para trás / arrependido – canto, ode ) de Helena, o perdão de Stesícoro e sua cura : este poeta cantara a deusa que nascera do Cisne, má, ruim e por isto ficou cego, sem vista e arrependido, convertido, em metanoia, canta-a boa e virtuosa e com isto recupera a visão, vista : Sócrates no diálogo purifica-se também dizendo que cantou errado e se corrige cantando certo : fala d’asas d’alma, do ser alado que é àlma elevada aos coros das Musas todas, do céu do Olimpo, alma qual carro puxado por cavalos, um branco outro preto, um de tendência ascendente e outro de tendência descendente, um corporal, sensível, carne e outro espiritual, penitente, sangue – a carne cortada, arrancada, tirada. Rédeas da mente entregue ao Auriga ( buddhi, discernimento, vijnana ) conduzem o carro adequadamente, impedem a guerra entre os cavalos de tendências diferentes do conjunto que é o carro / alma. Alma cae na terra e esquece que veio do céu.

Contudo, conforme a doutrina apresentada nos Upanishads os três passos existem enquanto um quarto estado, enquanto o conjunto único dos três elementos, três letras, três estados, três mundos : a unidade mesma é um quarto. Então a esta referência de Plutarco aos três passos deve corresponder os três parágrafos anteriores aos respectivos três aspectos, estados, etc. E isto acontece : o primeiro passo no parágrafo VIII quando da descoberta do corpo de Teseu que já reproduzimos aqui, o segundo no parágrafo seguinte o IX e o terceiro no X e XI em seguida. Vejamos o IX :
Escreve Ion que sendo ele ainda moço, fez uma refeição com Simão quando ele veio de Atenas desde Quio com Laomedonte e que tendo sido pedido que Simão cantasse, como não o houvesse feito sem graça, os presentes o louvaram como mais urbano que Temístocles, por este ter respondido em caso semelhante que não tinha a prendido a cantar nem nem tocar e o que ele sabia era fazer uma cidade grande e rica. Daí como era natural caiu a conversa sobre as façanhas de Simão e como se fizessem memória das mais significativas, disse que se passou a a referir ao mais conhecido dos seus estratagemas ; porque tendo tomado os aliados muitos cativos dos bárbaros em Sesto e em Bizâncio, encarregaram ao mesmo Simão o repartimento ; e ele tinha colocado de um lado os cativos e de outro os objetos e adornos que tinham, do que os aliados tinham se queixado, tendo por desigual esta divisão. Disse-lhes então que das duas partes escolhessem a que gostassem mais porque os atenienses com que deixassem se dariam por contentes. Aconselhando-lhes pois Herófito de Samos que elegessem antes os arreios dos persas que os persas mesmos, tomaram os adornos destes, deixando para os atenienses os cativos ; e então riram de Simão como de um mal repartidor porque os aliados carregaram colares, presilhas, braceletes de ouro e com vestidos e roupas ricas de púrpura, não ficando para os atenienses nada além de corpos mal cobertos para destinar ao trabalho ; porém logo baixaram da Frígia e da Lídia os amigos e devedores dos cativos e redimiram, libertaram, cada um deles por muito dinheiro ; de modo que Simão proviu de víveres as naves para quatro meses e ainda sobrou do resgate muito dinheiro para levar para Atenas.” A ideia é que a riqueza não é do corpo mas este separado a riqueza é da alma mesma : é clara a separação entre corpo grosseiro e corpo sutil que caracteriza o segundo passo. E aqui nesta história de Simão este segundo passo aparece visualmente enquanto uma conversão do olho, da visão, da vista, da forma de olhar o mundo, um olho interior e não mais exterior posto que é disto que se trata de olhar para dentro, para si mesmo : ‘gnoti s’autou’ conhece a ti mesmo, estava então escrito na porta de Delphus.

O terceiro passo nos parágrafos X e XI trazem versos antigos que lembram, como em um som primordial ecoando, a indiferença com a riqueza, própria de Simão, sua bondade, mão aberta, distribuindo os bens com todas as pessoas :

Rico já Simão, os viáticos da guerra, que fez os inimigos pagarem, os gastava melhor com seus cidadãos, porque retirou as cercas de suas possessões para que os forasteiros e os cidadãos necessitados pudessem tomar livremente de seus frutos o que gostassem. Em sua casa havia mesa, frugal sim, porém podia bastar para muitos todo dia ; e dos pobres podia entrar nela aquele que quisesse, encontrando comida sem ter que ganhá-la com seu trabalho, para atender apenas aos negócios públicos. ( seguem os versos lembrando sua bondade ) … porém o uso que fazia de sua opulência Simão excedia a antiga hospitalidade e humanidade dos atenienses ; porque aqueles com quem a cidade justamente se mostra ufana, deram aos gregos as sementes dos alimentos e os ensinaram o uso das águas das fontes e o modo de acender o fogo para o serviço das pessoas e este, Simão, erigindo sua casa como um pritaneo comum para os cidadãos dando gratuitamente as primícias dos frutos colhidos e tudo quanto de bom produz as estações do país, para que os forasteiros tomassem e desfrutassem, reproduziu de certa maneira aquela fabulosa comunhão de bens do tempo de Saturno / Cronos.” No parágrafo XI vemos os gregos vivendo em paz sem precisar fazer guerra exatamente como se estivessem na idade dourada a que se refere o parágrafo anterior que condiz com o lugar do terceiro passo, lugar da comunhão, da unidade, da indiferenciação, em que patrão e empregado se encontram qual iguais, servo e senhor indiferenciados.
Tudo isto nos permite aproximar para bem perto o diálogo Fedro de Platão, o Katha Upanishad e o Sermão da Montanha de IHS XTO : o primeiro e o segundo falam do mesmo carro d’alma sendo que este segundo disserta sobre os três passos, sobre alcançar esta meta espiritual, Brahman, Atma, trilhando o caminho e pergunta : pode um cego guiar outro cego ? A mesma pergunta que aparece no terceiro, no sermão da montanha de Jesus, que traz também a frase : ‘entrai pela porta estreita porque largo e espaçoso é o caminho que conduz á perdição ; estreita é a porta e apertado o caminho que conduz à vida e são poucos que o encontram.’ Esta mesma estreiteza, apertado de caminho aparece no segundo com a imagem da ponte da espada, a travessia do rio do mundo em cima de uma lâmina afiada.

O Katha Upanishad é o diálogo entre Naciketas e Yama, deus da morte, sendo Naciketas um sacerdote iniciante de dezesseis anos que está batendo na porta da casa da Morte por três dias sem comer nem beber : Mors Janua Vitae morte porta da vida. A penitência, a cruz, a morte, na religião. Yama depois de três dias chega e concede três dons, presentes, a Naciketas que é um mendicante pedindo oferta, esmola. Os três dons são os três passos sendo o último dom, passo, Brahman mesmo, a meta, poste, limite, último a ser alcançado. Vemos também aqui o olho invertido de que falamos a respeito de Simão, sobre voltar o olhar para si mesmo, para dentro. ‘O cego que guia outro cego’ seria não entregar as rédeas para buddhi, o discernimento, vijnana. E as pessoas seriam como árvores com raízes celestes : justamente como no sermão da montanha onde se discute o figo e as uvas, o cardo e o espinheiro. AUM = Pai Nosso que é proclamado no sermão da montanha.


Bibligrafia além dos livros citados :

Biografos Griegos, Aguillar, Madrid, 1973
Date, V. H., Upanishads Retold, 2 vols, MMPublishers, 1999, New Delhi, Índia.
Guénon, René, L’Homme et sont devenir selon le Vêdânta, Éditions Traditionnelles, Paris, 1984.
Coomaraswamy, Ananda, ‘Notes on the Katha Upanishad’ in Perceptions of the Vedas, MMPublishers, New Delhi Índia, 2000.



Cf http://vidasdebuddha.blogspot.com.br/2008/06/133-vejam-em-tua-fortaleza.html



1 a nave Argo atravessando as ´Rochas que batem´ soltam antes uma pomba para passar no contratempo: a pomba perde o rabo. Apolonio de Rodes.



quinta-feira, 23 de junho de 2016

500 Buddha Mah'Osadha ( cont. )





             ( Os cinco sábios em pintura de Ajanta, Índia. Mah'Osadha à direita )


500
Pleno de sabedoria… etc.” - Continuação com a Questão do Pobre e do Rico do Jataka 546, o penúltimo, história de Mah’Osadha e Amara que se reproduz em partes nos Jatakas 110, 111, 112, 170, 192, 364, 350, 387, 402, 452, 471, 500, 508, 515, 517, 518.

Mas Rainha Udumbara sabia que os outros conseguiram o conhecimento da questão através do sábio ; e ela pensou, “O rei deu o mesmo prêmio para todos os cinco, como uma pessoa que não vê diferença entre ervilhas e feijões. Com certeza meu irmão deveria ter tido um prêmio especial.” Então ela foi e perguntou ao rei,” Quem descobriu o enigma para ti, senhor ?” “Os cinco sábios, senhora.” “Mas meu senhor, através de quem os quatro tomaram conhecimento ?” “Não sei, senhora.” “Senhor, o quê aqueles senhores sabem ! Foi o sábio – que não desejava que estes tolos se arruinassem por causa dele e os ensinou a solução. E depois você deu o mesmo prêmio para todos os cinco. Isto não é justo ; deves fazer uma distinção ao sábio.” O rei ficou feliz que o sábio não revelou que tiveram conhecimento através dele e desejoso de dar a ele um prêmio ainda maior, ele pensou, “Deixa estar : vou perguntar a meu afilhado outra questão e quando ele responder lhe darei um grande prêmio.” Pensando nisto ele acertou a Questão do Pobre e do Rico.

Um dia quando os cinco sábios vieram até ele e quando estavam sentados confortavelmente, o rei disse, “Senaka, perguntarei uma pergunta.” “Pergunte, senhor.” Então ele recitou a primeira estrofe da Questão do Pobre e do Rico :

Pleno de sabedoria e despojado de riqueza, ou rico e sem sabedoria – pergunto a vocês esta questão, Senaka : qual destes dois, pessoas inteligentes consideram a melhor ?

Bem, esta questão foi transmitida de geração em geração na família de Senaka e então ele respondeu prontamente :

Verdadeiramente, Ó rei, sábios e tolos, pessoas educadas e não educadas, prestam serviço ao rico, sejam bem nascidos ou de casta baixa. Olhando isto digo : O sábio é medíocre e o rico é melhor.

O rei escutou esta resposta ; e então sem questionar os outros três, ele disse ao sábio Mah’Osadha sentado ao lado :

A ti também questiono, elevado em sabedoria, Mah’Osadha, que conhece toda a Lei : um tolo com riqueza ou um sábio com poucas provisões, qual dos dois, pessoas inteligentes consideram a melhor ?

Então o Grande Ser respondeu, “Escute, Ó rei :

O tolo comete atos pecaminosos, pensando ‘Neste mundo sou o melhor’ ; ele olha para este mundo e não para o próximo e pega o pior de ambos. Olhando isto digo : O sábio é melhor que o tolo rico.

Isto dito, o rei olhou para Senaka : “Bem, você vê Mah’Osadha dizer que o sábio é melhor.” Senaka, disse, “Sua majestade, Mah’Osadha é uma criança ; mesmo agora sua boca cheira a leite. O quê ele pode saber ?” e recitou uma estrofe :

Ciência não produz riqueza, nem família ou beleza pessoal. Olhe aquele idiota do Gorimanda grandiosamente próspero porque a Fortuna favoreceu o tratante. Olhando isto digo : O sábio é medíocre, o rico é melhor.

Escutando isto o rei disse, “E agora, Mah’Osadha meu filho ?” Ele respondeu, “Meu senhor, o quê Senaka sabe ? Ele é qual corvo onde se espalhou arroz, qual cachorro tentando lamber leite : olha a si mesmo mas não vê a vara que esta pronta a cair sobre sua cabeça. Escute meu senhor,” e ele recitou esta estrofe :

Aquele que é de pouco entendimento, quando consegue riqueza, está intoxicado : atingido pelo infortúnio fica estupidificado : atingido por má ou boa fortuna segundo seja a sorte, ele retorce-se como peixe em Sol quente. Olhando isto digo : O sábio é melhor que o tolo rico.

Agora então, Mestre !” disse o rei escutando isto. Senaka disse, “Meu senhor, o quê ele sabe ? Sem falar de pessoas, é a boa árvore cheia de frutos para a qual os pássaros vão,” e ele recitou esta estrofe :

Como na floresta, os pássaros reúnem-se de todos os cantos n’árvore que tem frutos doces, assim ao homem rico que tem tesouros e riquezas aglomeram-se bandos juntos para seu benefício. Olhando isto digo : O sábio é medíocre, o rico é o melhor.

Bem, meu filho, é agora ?” o rei perguntou. O sábio respondeu, “O quê aquele barriga de balde sabe ? Escute meu senhor,” e recitou esta estrofe :

O tolo poderoso não faz bem em ganhar riqueza pela violência ; rugindo alto como gosta, eles ( nirayapala, guardiões dos ínferos ) carregam o simplório para os ínferos. Olhando isto digo : O sábio é melhor que o tolo rico.

Novamente o rei disse, “Bem, Senaka ?” ao que Senaka respondeu :

Qualquer corrente que se derrame no Ganges, todas estas perdem seus nome e espécie. O Ganges derramando-se no mar, não mais se distingue. Assim o mundo é dedicado à riqueza. Olhando isto digo : O sábio é medíocre, o rico é melhor.

Novamente o rei disse, “Bem, sábio ?” e ele respondeu, “Escute, Ó rei !” com um par de estrofes :

Este poderoso oceano do qual ele fala, dentro do qual fluem rios inumeráveis, este mar batendo incessantemente nas praias não podem nunca ultrapassá-las apesar de ser poderoso oceano. Assim é com o palavrório do tolo : sua prosperidade não pode ultrapassar a do sábio. Olhando isto digo : O sábio é o melhor que o próspero tolo.

Bem, Senaka ?” disse o rei. “Escute, Ó rei !” disse ele e recitou esta estrofe :

Uma pessoa rica em alta posição pode não ter autocontrole mas se fala algo para os outros, sua palavra tem peso no meio do seu Povo ; mas sabedoria não tem este efeito para a pessoa sem riqueza. Olhando isto digo : O sábio é medíocre, o rico é melhor.

Bem, meu filho ?” disse o rei novamente. “Escute senhor ! O quê o estúpido do Senaka sabe ?” e recitou esta estrofe :

Para o benefício de outro ou seu próprio, o tolo e de pouco entendimento fala falsamente ; ele é envergonhado no meio da companhia e com isto entra em miséria. Olhando isto digo : O sábio é melhor que o rico tolo.

Depois Senaka recitou uma estrofe :

Mesmo que alguém seja de grande sabedoria mas sem arroz ou grãos e carente, diga alguma coisa, sua palavra não tem peso no meio de seu Povo, e prosperidade não vem para pessoa devido a seu conhecimento. Olhado isto digo : O sábio é medíocre, o rico é melhor.

Novamente o rei disse, “O que diz você a isto, meu filho ?” E o sábio respondeu, “O quê Senaka sabe ? Ele olha este mundo não o próximo,” e recitou esta estrofe :

Não para seu bem nem para de outrem, fala uma mentira a pessoa de grande sabedoria ; ele é honrado no meio da assembleia e na vida futura seguirá feliz. Olhando isto digo : O sábio é melhor que o tolo rico.

Então Senaka recitou uma estrofe :

Elefantes, gado, cavalos, brincos em joias, mulheres, encontram-se em famílias ricas ; isto tudo é para o gozo da pessoa rica sem poderes sobrenaturais. Olhando isto digo : O sábio é medíocre, o rico é melhor.

O sábio disse, “O quê ele sabe ?” e continuando a explicar o assunto recitou esta estrofe :

O tolo que obra atos sem pensar e fala palavras tolas, o não sábio, é jogado fora pela Fortuna como a serpente joga fora a pele velha. Olhando isto digo : O sábio é melhor que o tolo rico.

E agora ?” perguntou o rei então ; e Senaka disse, “Meu senhor, o quê pode este pequeno garoto saber ? Escute !” e ele recitou esta estrofe, pensando que silenciaria o sábio :

Somos cinco sábios, venerável senhor, todos te servindo com gestos de respeito ; e tu és nosso senhor e mestre, qual Sakra, senhor das criaturas, rei dos deuses. Olhando isto digo : O sábio é medíocre, o rico é melhor.

Quando o rei escutou isto ele pensou, “Isto foi bem colocado por Senaka ; cogito se meu filho será capaz de refutar isto e dizer algo mais.” Então perguntou-lhe, “Bem, sábio senhor, e agora ?” mas este argumento de Senaka não havia ninguém capaz de refutá-lo exceto o Bodhisatva ; então o Grande Ser refutou-o dizendo “Senhor, o quê este tolo sabe ? Ele olha apenas para si mesmo e não conhece a excelência da sabedoria. Escute, senhor,” e ele recitou esta estrofe :

O tolo rico é apenas escravo da pessoa sábia quando questões deste tipo surgem ; quando o sábio resolve-a inteligentemente, então o tolo cai em confusão. Olhando isto digo : O sábio é melhor que o tolo rico.

Como se espalhasse areia dourada no sopé do Sineru, como se levasse a lua cheia alto no céu, assim ele estabeleceu este argumento, assim o Grande Ser mostrou sua sabedoria. Então o rei disse a Senaka, “Bem, Senaka, cubra esta se podes !” Mas como alguém que usou todo o milho do celeiro, ele sentou sem resposta, perturbado, lamentando-se. Se pudesse produzir outro argumento, mesmo mil estrofes não terminaríamos este Jataka. Mas quando ele permaneceu sem resposta, o Grande Ser continuou com esta estrofe em louvor à sabedoria, como se derramasse águas torrenciais :

Verdadeiramente sabedoria é estimada pelos bons ; riqueza é amada porque as pessoas são devotas do prazer. O conhecimento dos Buddhas é incomparável e riqueza nunca suplantará sabedoria.

Escutando isto o rei ficou tão agraciado com a solução da questão pelo Grande Ser que ele o presenteou com uma chuva de riquezas e recitou uma estrofe :

O que quer que pergunte ele me responde, Mah’Osadha o único pregador da Lei. Mil vacas, um touro e um elefante e dez carruagens puxadas por puro sangue e dezesseis excelentes cidades, aqui te dou, agradecido com tua resposta à questão.

( Aqui termina a Questão do Rico e do Pobre )



terça-feira, 24 de maio de 2016

499 Buddha Rei Sivi



 







 
  (Acima o Rei Sivi sem os olhos e abaixo a distribuição de ofertas com versão à cores ; pinturas de Ajanta )

499
Se houver algum ...etc.” - Esta história o Mestre contou enquanto residia em Jetavana sobre o presente, oferta, incomparável. A circunstância foi amplamente contada no Jataka 424. Mas aqui, o rei, no sétimo dia, ofertou todos os requisitos e pediu agradecimentos ; mas o Mestre saiu sem agradecê-lo. Após o lanche o rei foi ao mosteiro e disse, “Por quê não agradeceste, Senhor ?” O Mestre disse, “O povo estava impuro, sua majestade.” Ele continuou declarando a Lei, recitando a estrofe que começa “Para o céu o avarento não irá ( Dhammapada, 177 )”. O rei, agradecido de coração, fez reverência ao Tathagata presenteando-o com um manto da país Sivi ( Sibi ) válido mil peças de dinheiro ; depois ele voltou para a cidade.

Dia seguinte falavam disto no Salão da Verdade : “Senhores, o rei de Kosala deu o presente incomparável : e não contente com isto, quando o Dasabala discursou para ele, o rei deu-lhe um roupa de Sivi válida de mil peças ! Como o rei é insaciável em ofertar, com certeza !” O Mestre entrou e questionou o quê conversavam lá sentados : eles lhe disseram. Ele falou, “Irmãos, coisas materiais, exteriores, são aceitáveis, verdadeiras : mas sábios antigos, que deram presentes até toda a Índia soar novamente com a fama deles, cada dia distribuindo aproximadamente seiscentas mil peças de dinheiro, estavam insatisfeitos com presentes exteriores ; e lembrando o provérbio, ‘Dê o quê te é caro e o amor surgirá’, eles, mesmo aos olhos arrancaram e deram àqueles que pediram.” Com estas palavras, ele contou uma história do passado.

_______________________

Certa vez, quando o poderoso Rei Sivi reinava na cidade de Aritthapura no reino de Sivi, o Grande Ser nasceu como seu filho. Eles o chamaram de Príncipe Sivi. Quando ele cresceu, ele foi para Takkasila ( Taxila ) e estudou lá; voltando ele mostrou seu conhecimento a seu pai o rei e por ele foi feito vice-rei. Com a morte de seu pai tornou rei ele mesmo e, abandonando os caminhos do mal, ele guardou as Dez Virtudes Reais e legislou com retidão. Ele fez com que se construísse seis salões de ofertas, nos quatro portões, no meio da cidade, e na sua própria porta. Ele foi munificente em distribuir cada dia seiscentas mil peças de dinheiro. No oitavo, décimo quarto e décimo quinto dias ele nunca faltava de visitar os salões de ofertas para ver a distribuição ser feita.

Uma vez no dia da lua cheia, o parassol de estado foi levantado cedo de manhã e ele sentou no trono real pensando sobre os presentes que dera. Pensou ele consigo mesmo, “De todas as coisas exteriores não há nenhuma que não dei ; mas este tipo de oferta não me contenta. Quero doar algo que seja parte de mim mesmo. Bem, neste dia indo para o salão de ofertas, faço o voto de que se alguém me pedir algo não fora de mim mesmo mas nomear algo que seja parte de mim mesmo, - mesmo se mencionar meu coração, cortarei meu peito com uma lança e como se estivesse carregando um lírio d’água, caule e tudo, de um lago tranquilo, arrancarei meu coração pingando de sangue e darei a ele : se mencionar a carne do meu corpo, cortarei fora a carne do corpo e a darei, como se estivesse gravando com um instrumento de gravação : que se mencione meu sangue, darei meu sangue pingando em sua boca ou enchendo uma tigela : ou se alguém disser, não consigo que façam meu serviço doméstico, venha e me faça a parte do empregado em casa, então largarei minha veste real e ficando fora, proclamarei a mim mesmo empregado e farei trabalho de empregado : se alguém pedir meus olhos, arrancarei para fora meus olhos e os darei, como alguém que arranca o âmago de uma palmeira.” Assim ele pensou consigo mesmo :

Se houver algum presente humano que nunca ofertei,
Seja meus olhos, darei agora, inteiramente firme e sem medo.

Então ele se banhou com dezesseis cântaros de água perfumada e adornou-se em toda magnificência e após refeição de comida fina ele montou no elefante ricamente ajaezado e foi para o salão de oferta.
Sakra percebendo sua resolução pensou, “Rei Sivi está determinado a doar seus olhos a qualquer um que vier os pedir. Será ele capaz de fazer isto ou não ?” Determinou testá-lo ; e, na forma de um brahmin velho e cego, postou-se em um lugar alto e quando o rei veio para seu salão de ofertas ele esticou sua mão e ficou gritando, “Vida longa ao rei !” Então o rei dirigiu o elefante até ele e disse, “O quê disseste brahmin ?” Sakra disse a ele, “Ó grande rei ! Em todo o mundo habitado não há nenhum lugar onde a fama de seu coração munificente não tenha soado. Sou cego e você tem dois olhos.” Então ele repetiu a primeira estrofe, pedindo por um olho :

Para pedir um olho o velho vem de longe pois não tenho nenhum :
Ó, me dê um dos teus, prego, então teremos cada um um.

Quando o Grande Ser escutou isto, ele pensou, “Pois isto é justo o quê estava pensando em meu palácio antes de vir ! Que chance boa ! O desejo de meu coração será preenchido ho-je ; darei um presente que ninguém nunca deu.” E ele recitou a segunda estrofe :

( As estrofes seguintes devem ser lidas duas a duas, como facilmente pode ser visto. )

Sujampati entre os deuses, o mesmo
Aqui entre as pessoas chamado Maghava de nome,
Ele me ensinou a seguir nesta direção meu caminho,
Pedir e por um olho clamar, insistir.

O maior de todos os presentes que peço.
Me dê um olho ! Ó, não me diga não !
Dê-me um olho, o presente entre os presentes,
Tão difícil para as pessoas desfazer-se, como dizem !

O desejo que te traz aqui, o desejo que surgiu
Dentro de ti, seja este desejo realizado. Aqui, brahmin, tome meus olhos.

Um olho tu me pedes : veja, te dou dois !
Vá com boa visão, à vista de todo o Povo ;
Seja teu desejo cumprido e agora realizado.

Tal disse o rei. Mas pensando que não era adequado que ele arrancasse os olhos e os concedesse lá então, ele trouxe o brahmin para dentro com ele e sentando no trono real, mandou chamar um cirurgião de nome Sivaka. “Retire meus olhos,” ele disse então.
Bem, toda a cidade soava com a novidade de que o rei desejava arrancar os olhos e dá-los a um brahmin. Então o comandante-em-chefe e todos os outros oficiais, e aqueles amados pelo rei, reuniram-se da cidade e do harém e recitaram três estrofes, em que eles tentavam afastar o rei desta intenção :

Ó, não dê teus olhos, meu senhor ; não nos abandone, Ó rei !
Dê dinheiro, pérolas e coral e coisas muitas preciosas :

Dê corcéis ajaezados, rodem as carruagens para fora,
Ó rei, dirija os elefantes todos elegantes com roupas douradas :

Dê isto, Ó rei ! Para que possamos te preservar são e salvo,
Teu Povo fiel, com nossos carros e carruagens alinhados ao redor.

Com isto o rei recitou três estrofes :

A alma que, tendo jurado doar, é depois encontrada sem fé,
Coloca seu próprio pescoço dentro de uma armadilha escondida embaixo no chão.

A alma que, tendo jurado doar, é depois encontrada sem fé,
É mais pecadora que o pecado e ele à casa de Yama está atado.

Sem ser pedido nada dê ; nem dê a coisa não pedida,
Isto portanto que o brahmin pede, dou imediatamente.

Então os cortesãos perguntaram, “O quê desejas doando os olhos ?” repetiram a estrofe :

Vida, beleza, alegria ou força – qual é o prêmio,
Ó rei, qual motivo teu gesto produz ?
Por quê deveria o rei da terra Sivi, supremo
Pelo bem da vida futura, doar seus olhos ?

O rei respondeu-lhes em uma estrofe :

Em doar assim, glória não é meu objetivo,
Nem filhos, nem riqueza, ou reinos controlar :
Este é o bom antigo caminho das pessoas santas ;
Minha alma ama fazer ofertas.

Às palavras do Grande Ser os cortesãos nada responderam ; então o Grande Ser dirigiu-se a Sivaka o cirurgião em uma estrofe :

Um amigo e camarada, Sivaka, tu és :
Faço como te peço – tens habilidade suficiente -
Retire meus olhos, pois este é meu desejo,
E nas mãos do mendicante entregue-os agora.

Mas Sivaka disse, “Pense, meu senhor, dar os olhos não é coisa à toa.” - “Sivaka, já pensei ; não demore, nem fale muito na minha presença.” Então ele pensou, “Não é apropriado que um cirurgião habilidoso como eu deva cortar os olhos do rei com o bisturi,” então ele pesou algumas substâncias, esfregou o pó numa lótus azul e escovou com isto o olho direito : o olho rolou e houve grande dor. “Reflita, meu rei, posso acertar tudo.” - “Continue, meu amigo, não retarde, por favor.” Novamente ele esfregou o pó e escovou sobre o olho : o olho saltou da órbita, a dor foi pior que antes. “Reflita, meu rei, ainda posso restaurá-lo.” - “Seja rápido com o serviço !” Uma terceira vez ele esfregou o pó ácido aplicando-o : pelo poder da droga o olho rolou, saindo fora da órbita pendurando-se na extremidade do tendão. “Reflita, meu rei, ainda posso restaurá-lo novamente.” -”Seja rápido.” A dor foi extrema, sangue pingava, as roupas do rei estava manchadas de sangue. As mulheres do rei e os cortesãos caíram aos pés dele, gritando, “Meu senhor, não sacrifique teus olhos !” alto chorando e lamentando. O rei resistiu à dor e disse, “Meu amigo, seja rápido.” “Muito bem, meu senhor,” disse o médico ; e com sua mão esquerda segurando o globo ocular pegou uma faca com a direita e cortando o tendão colocou o olho na mão do Grande Ser. Ele, olhando com seu olho esquerdo para o direito e aguentando a dor, disse, “Brahmin, venha aqui.” Quando o brahmin aproximou-se, ele continuou - “O olho da onisciência é mais caro que este olho cem vezes, não, mil vezes : aí está a razão para minha ação,” e o deu para o brahmin, que o levantou e colocou em sua própria órbita ocular. Lá permaneceu fixo através de seu poder como uma lótus azul aberta. Quando o Grande Ser com seu olho esquerdo viu aquele olho na cabeça do outro, ele gritou - “Ah, como é bom este meu presente de um olho !” e todo arrepiado com a alegria que surgiu dentro dele, deu também o outro olho. Sakra colocou este também no lugar de seu próprio olho e partiu do palácio do rei, depois da cidade, com o olhar da multidão sobre ele e foi para o mundo dos deuses.

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O Mestre, explicando isto, repetiu uma estrofe e meia :

Assim Sivi incitou Sivaka e cumpriu o que tinha em mente.
Ele tirou os olhos do rei fora e os entregou para o brahmin :
E agora o brahmin tinha os olhos e o rei estava cego.

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Em pouco tempo os olhos do rei começaram a crescer ; enquanto cresciam e antes de alcançarem o topo dos orifícios, uma massa de carne surgiu dentro como uma bola de lã, preenchendo a cavidade ; eles eram como olhos de boneca mas a dor cessou. O Grande Ser ficou no palácio alguns dias. Então ele pensou, “O quê um cego tem a ver com legislar ? Transmitirei o reino para os cortesãos, irei para o parque e me tornarei asceta vivendo como homem santo.” Ele reuniu seus cortesãos e contou a eles sua intenção. “Uma pessoa,” ele disse, “deve ficar comigo, para lavar meu rosto e assim por diante fazendo o que é devido e vocês devem amarrar uma corda para me guiar para os lugares de descanso.” Chamando então seu auriga, ordenou-o que preparasse a carruagem. Mas os cortesãos não permitiriam que fosse de carruagem ; eles o levaram para fora numa liteira dourada e o colocaram às margens do lago, e então, guardando-o ao redor, retornaram. O rei sentou na liteira pensando sobre seu presente.

Naquele momento o trono de Sakra ficou quente ; e ele ponderando percebeu a razão. “Oferecerei um dom ao rei,” pensou ele, “e farei seu olho ficar são novamente.” Então para aquele lugar ele veio ; e não distante do Grande Ser, ele andava para cima e para baixo, para cima e para baixo.

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Para explicar isto o Mestre recitou estas estrofes :

Poucos dias passaram ; os olhos começaram a se curar e aparecer :
O rei da terra Sivi então chama seu auriga.

Prepare a carruagem, auriga ; faça-me saber :
Vou para o parque, lago, floresta com lírios que crescem’.

Ele o sentou numa liteira às margens do lago e aí
Sujampati , o rei dos deuses, grande Sakra, apareceu.

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Quem está aí ?” gritou o Grande Ser, quando escutou o som do passos. Sakra repetiu uma estrofe :

Sakra, o rei dos deuses, eu sou ; vim visitar você :
Escolha um dom, Ó sábio real ! O quê quer que teu desejo possa nomear.

O rei respondeu com outra estrofe :

Riqueza, força, e tesouros sem fim, estes deixei para trás :
Ó Sakra, morte e nada mais desejo : pois sou cego.

Então Sakra disse, “Você pede a morte, Rei Sivi, porque desejas morrer ou porque estás cego ?” - “Porque estou cego, meu senhor.” - “O presente não é tudo em si mesmo, sua majestade, ele é dado com um olho no futuro. Contudo há um motivo relacionado a este mundo visível. Bem, te pediram um olho e deste dois ; faça um Ato de Verdade sobre isto.” Então ele começou uma estrofe :

Ó guerreiro, senhor dos bípedes, declare o quê é a verdade :
Se declarares a verdade, teu olho será restaurado para ti.

Escutando isto, o Grande Ser respondeu, “Se você deseja me dar um olho, Sakra, não tente outros meios mas deixe meu olho ser restaurado como consequência da minha oferta.” Sakra disse, “Apesar de me chamarem de Sakra, rei dos deuses, sua majestade, ainda assim não posso dar um olho para ninguém ; mas pelo fruto da oferta por ti feita, e por nada mais, teu olho pode ser restaurado para ti.” Então o outro repetiu uma estrofe, mantendo que sua oferta foi bem oferecida :

Qualquer espécie, qualquer tipo de requerente que se aproxime,
Quem quer que venha me pedir algo, este ao meu coração é caro :
Se estas minhas palavras solenes são verdadeiras, que meu olho apareça agora !

Enquanto ele pronunciava as palavras, um dos seus olhos cresceu na órbita. Então ele repetiu um par de estrofes para restaurar o outro :

Um brahmin veio me visitar, um dos meus olhos rogava :
Para aquele brahmin mendicante dei o par deles.

Uma grande alegria mais satisfação aquela ação propiciou.
Se estas palavras solenes são verdadeiras, restaure-se o outro olho !

Imediatamente apareceu seu segundo olho. Mas estes olhos dele não eram nem naturais nem divinos. Um olho dado por Sakra qual brahmin, não pode ser natural, sabemos ; por outro lado, um olho divino não pode ser produzido em nada que esteja machucado. Mas estes olhos são chamados os olhos da Verdade Absoluta e Perfeita. Naquele tempo quando veio à existência, todo o cortejo real foi reunido pelo poder de Sakra ; e Sakra de pé no meio do ajuntamento, pronunciou louvor em um par de estrofes :

Ó filho da terra Rei de Sivi, estes hinos santos teus
Te fez ganhar como fruto da graça este par de olhos

Através da rocha e parede, acima do monte e no vale, qualquer barreira que seja.
Cem léguas para todo lado estes teus olhos veem.
Tendo pronunciado estas estrofes pousado no ar diante da multidão, com um último conselho para o Grande Ser de que ele devia ser vigilante, Sakra retornou para o mundo dos deuses. E o Grande Ser, cercado por seu cortejo, voltou em grande pompa para a cidade e entrou no palácio chamado Candaka, Olho do Pavão. As novidades de que ele conseguiu seus olhos novamente espalhou-se por todo o Reino de Sivi. Todas as pessoas reuniram-se para vê-lo com presentes em suas mãos. “Agora que toda esta multidão está reunida,” pensou o Grande Ser, “devo louvar a oferta que fiz.” Fez com que se colocasse um grande pavilhão no portão do palácio, onde se sentou no trono real, com o parassol branco aberto sobre ele. Então o tambor foi enviado pela cidade a bater, para coletar de todas as guildas de comércio. Então ele disse, “Ó Povo de Sivi ! Agora que vocês viram estes divinos olhos, nunca comam comida sem ofertar um pouco !” e ele repetiu quatro estrofes, declarando a Lei :

Quem, questionado a doar, responderia não,
Mesmo sendo seu dom melhor e mais caro ?
Povo de Sivi reunido em concurso !
Venham aqui, vejam o dom de Deus, meus olhos !

Através da rocha e parede, acima do monte e no vale, qualquer barreira que seja.
Cem léguas para todo lado estes meus olhos veem.
Auto sacrifício em todas as pessoas mortais viventes,
De todas as coisas é a mais preciosa :
Sacrifiquei um olho mortal ; e doando
Recebi um olho divino.

Veja, Povo ! Veja, doe antes de comer, deixeis outros ter uma parte.
Isto feito com tua melhor vontade e cuidado,
Sem culpa para o céu afluireis.

Nestes quatro versos ele declarou a Lei ; e após isto, toda quinzena, no dia santo, ele declarava a Lei com estes mesmos versos sem cessar para um grande aglomerado do Povo. Escutando isto, o Povo fazia ofertas e obras boas e foi preencher as hostes celestes.

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Quando o Mestre terminou este discurso, ele disse, “Assim Irmãos, sábios antigos doavam a quem viesse, quem não estava contente com presentes exteriores, mesmo seus próprios olhos arrancavam da cabeça.” Então ele identificou o Jataka : “Naquele tempo ananda era Sivaka o médico, Anurudha era Sakra, os seguidores do Buddha eram o Povo e eu mesmo era Rei Sivi.”