quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

511 Buddha rei de Benares

 



511           Kimchanda jataka

 

          “Por que tu...etc.” – Esta história o Mestre contou enquanto residia em Jetavana sobre a observância de dias de jejum.

        Bem, um dia quando um número de Irmãos e Irmãs leigos, que estavam guardando dia de jejum, vieram escutar a Lei e estavam sentados no Salão da Verdade, o Mestre perguntou a eles se estava guardando dias de jejum e quando eles disseram que estavam, ele adicionou, “Vocês fazem bem em observar dias de jejum: homens antigos, em consequência de guardarem metade de um dia de jejum, atingiram grande glória,” e com o pedido deles ele contou um conto do passado.

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           Certa vez em Benares, Brahmadatra reinava em seu reino com retidão e sendo crente era zeloso na observância dos deveres do dia de jejum, em guardar os mandamentos e em dar esmola. Ele também induziu seus ministros e os outros para que fizessem votos de castidade e semelhantes. Mas seu capelão era caluniador, ganancioso de subornos e um produtor de julgamentos injustos. O rei no dia de jejum reuniu seus conselheiros e pediu-lhes que guardassem o jejum. O sacerdote não guardou consigo mesmo os deveres do jejum; então durante o dia esteve recebendo propinas e dando falsos julgamentos e quando foi para a corte prestar respeito ao rei, o rei, após perguntar a cada um de seus ministros primeiro se estavam guardando o jejum, questionou também o sacerdote, dizendo, “E estás tu, Senhor, jejuando?” Ele contou uma mentira e disse “Sim” e deixou o palácio. Um certo ministro o censurou dizendo, “Certamente você não está guardando o jejum.” Ele respondeu, “Me alimentei cedo de manhã mas quando voltar para casa vou enxaguar a boca e guardando comigo mesmo os deveres do dia de jejum não comerei nada à noite e toda a noite guardarei a lei moral e desde modo guardarei metade de um dia de jejum.” “Muito bem, Senhor”, disseram. E ele foi para casa e fez isto.  Bem, um dia enquanto ele estava sentado em julgamento, uma certa mulher, que guardava os preceitos morais, tinha um caso em julgamento e não sendo capaz de ir para casa, ela pensou, “Não transgredirei a observância do dia de jejum,” e quando aproximava-se o tempo ela passou a enxaguar sua boca. Naquele momento uma penca de mangas maduras foi trazida para o brahmin. Ele percebeu que a mulher estava guardando jejum e disse, “Coma isto e assim guarde o jejum.” Ela fez isto. Basta de ações do brahmin. Logo logo ele morreu e nasceu novamente no país Himalaia em um lugar adorável na margem do ramo Kosibi do Ganges, em um bosque de mangas, extenso três léguas, em uma esplêndida cama real de um palácio dourado.  Ele nasceu novamente como alguém que acabou de acordar do sono, bem vestido e adornado, com muita beleza de forma e acompanhado de dezesseis mil ninfas. Durante toda a noite ele gozou desta glória de nascer qual Espírito em uma aparição de palácio, seu prêmio correspondente a seu ato. Então ao se aproximar a aurora ele entrou no bosque de manga e no momento de sua entrada seu corpo divino desapareceu e ele assume uma forma tão alta quanto uma palmeira, oitenta cúbitos de altura, e todo seu corpo queima como uma árvore da judeia em plena floração. Tinha apenas um dedo em cada mão, enquanto suas unhas eram grandes quais enxadas e com estas unhas ele cravava a carne nas suas costas e rasgava ela e comia, e louco com a dor que sofria, pronunciava um alto grito. Ao crepúsculo este corpo desaparecia e sua divina forma reaparecia. As garotas dançarinas celestes, com vários instrumentos musicais em suas mãos, o atendiam e gozando de grande honra ele ascende para o palácio divino em um encantador bosque de manga. Assim ele, como resultado de dar uma manga a uma mulher que guardava jejum, adquiriu um bosque de manga, três léguas de extensão, mas em consequência de receber propinas e produzir falsos julgamentos, ele rasga e come a carne de sua própria costa, enquanto devido ao fato de ter guardado meio dia de jejum, ele goza de glória durante a noite, cercado por um harém de dezesseis mil ninfas dançantes. 

                Neste tempo o rei de Benares, cônscio dos pecados dos desejos, adotou a vida ascética e fixou residência em uma cabana de folhas, em um lugar agradável no baixo Ganges, subsistindo do que catava, colhia. Um dia uma manga madura daquele bosque, do tamanho de uma tigela grande, caiu no Ganges e foi levada pela corrente ao lugar oposto ao que estava residindo este asceta. Enquanto ele enxaguava a boca, viu a manga flutuando no meio da corrente e atravessando ele a pegou, a trouxe para seu eremitério e a colocou na cela onde seu fogo sagrado era mantido. Então, cortando a manga com uma faca, ele comeu justo apenas para sustentar a vida e cobrindo o resto com folhas de bananeira, ele repetidamente, dia após dia, comeu da fruta, enquanto ela durou. E quando já estava toda consumida, ele não conseguia comer nenhum outro tipo de fruta mas tornando-se escravo do seu apetite por gostosuras, ele fez o voto de apenas comer manga madura e descendo a margem do rio ele sentou olhando a corrente, determinado a nunca mais levantar-se até que tivesse encontrado manga. Lá jejuou por seis dias consecutivos e sentado procurava o fruto até que estava seco pelo vento e pelo calor. Bem, no sétimo dia uma deusa do rio, refletindo sobre o assunto, entendeu a razão da ação dele e pensando, “Este asceta, sendo escravo de seu apetite, está sentado jejuando por sete dias, olhando para o Ganges: é errado negar a ele uma manga madura: pois sem ela ele morrerá; darei uma a ele.” Então ela veio e permaneceu nos ares acima do Ganges e conversando com ele pronunciou a primeira estrofe:

    

         Por que tu permaneces nesta margem de rio durante o calor do verão?

              Brahmin, qual tua esperança secreta? Que objetivo alcançarias?

 

      O asceta escutando isto repetiu nove estrofes:

 

       Boiando na corrente, bela ninfa, uma manga eu vi;

       Esticando o braço peguei a fruta e a trouxe para casa comigo.

 

      Tão doce era de gosto e de cheiro, que a considerei um prêmio e tanto;

      Sua bela forma compara-se com o maior jarro de água em tamanho.

 

     A escondi no meio de folhas de bananeira e a fatiava com uma faca;

    Um pouco serve de comida e de bebida a alguém de vida simples.

 

    Meu estoque acabou, minha angústia apaziguou mas ainda devo me afligir

    Em outros frutos que possa encontrar, não tenho nenhum contentamento.     

     

    Sofro; aquela doçura da manga que resgatei das ondas

    Trará minha morte, temo. Não anelo nenhum outro fruto.

 

   Te contei porque jejuo, apesar de residir ao lado de um rio

   Cujas largas ondas pululam com todos os peixes nadando.

 

  E agora te peço diga-me e não fujas atemorizada

  Ó amável donzela, quem és tu e por que estás aqui.

 

  Belas são as criadas dos deuses, como ouro cor de fogo elas são,

  Graciosas qual filhote de tigre brincando nas encostas das montanhas.

 

  Aqui também no mundo das pessoas as mulheres são belas de ver,

  Mas nenhuma entre os deuses ou as pessoas pode ser comparada contigo.

  Pergunto a ti então, Ó amável ninfa, dotada de graça celeste,

  Declare-me teu nome e parentesco e de onde deriva tua raça.

 

           Então a deusa pronunciou oito estrofes: 

 

   Por esta bela corrente, ao lado da qual tu sentas, Ó brahmin, eu presido,

  E resido abaixo nas vastas profundezas, sob as ondas que rolam do Ganges.

 

  Toda protegida com floresta crescida tenho mil cavernas nas montanhas,

  De onde flui igual número de rios que misturam-se com minhas ondas.

 

  Cada bosque e floresta, caras aos Nagas, enviam muitos riachos cheios,

  E entregam seus estoques de águas azuis, enchendo meu amplo curso.

 

  Geralmente carregados nestes rios tributários são frutos de todas as árvores,

  Jambos, fruta-pão, castanhas e figos, com mangas pode-se ver.

 

  E tudo que cresce em ambas as margens e cai dentro do meu alcance,

  Clamo como prêmio de direito e ninguém meu título pode impedir. 

 

  Sabendo disto, me escute, Ó sábio e estudado rei,

  Pare de ser indulgente com desejo do teu coração – renuncie a coisa maldita.

 

  Ó legislador primeiro de amplos domínios, não posso louvar teu ato,

  Desejar a morte, no começo da juventude, grande loucura, certamente, denuncia.

 

  Brahmins e anjos, deuses e pessoas, todos conhecem teus atos e nome,

  E santos que por sua santidade atingiram na terra a fama –

  Sim, todos estes sábios e famosos, proclamam teu ato de pecado. 

 

        Então o asceta pronunciou quatro estrofes:

 

     Alguém que saiba quão frágil é nossa vida e quão transitórias as coisas dos sentidos,

     Nunca pensa em matar a outro mas reside na inocência.

 

    Honrada antes por santos em conselho, dona de um nome virtuoso,

   Agora conversando com pessoas pecadoras, tu ganharás má fama.

 

   Se eu morresse em tuas margens, ninfa dotada de bela forma,

   Má reputação cairia sobre ti, como a sombra de uma nuvem.

 

   Portanto, bela deusa, peço a ti, se afaste de todo ato vil,

   Para que não tenhas, pelo ditado do Povo, que lamentar que causaste minha morte.

           

      Escutando isto, a deusa respondeu em cinco estrofes:

 

   Bem, eu sei o teu desejo secreto tão pacientemente carregado,

   E faço de mim mesma tua serva dando para ti a manga.

   Olhe! Prazeres vis anteriores, prazeres difíceis de serem abandonados,

   Tu ganhaste, manter para sempre, santidade e paz da mente.

 

  Aquele que, liberto de laços anteriores, abraça grilhões que antes abjurou,

 Duramente trilhando caminhos não santos, sempre peca mais e mais.

 

 Te darei teu desejo anelado e farei teus problemas cessarem,

 Te levando a lugares legais, onde possas habitar em paz.

 

  Garças, pássaros maynah e cucos, com os gansos vermelhos que amam

  Pegar néctar das flores, cisnes que movem-se em tropas,

  Pássaros dos arrozais e senhores pavões, com suas canções acordam o bosque.

 

  Flores kadamba e açafrão descansam qual palha no chão,

  Castanhas maduras, palmeiras adornando, penduradas em pencas ao redor,

  E, no meio de galhos carregados, veja como mangas aqui abundam!

 

       E cantando os louvores do lugar ela transportou o asceta para lá, e mandando a ele que comesse manga neste bosque até saciar sua fome, ela seguiu seu caminho. O asceta, comendo mangas até ter apaziguado seu apetite, descansou um pouco. Então, enquanto ele vagava pelo bosque, espreitou o Espírito no estado de sofrimento e não teve coração para pronunciar uma palavra para ele mas ao crepúsculo ele o viu sendo ajudado pelas ninfas e no gozo de glória celeste e dirigiu-se a ele em três estrofes:

 

      Toda a noite ungido, festejando, com uma coroa nas sobrancelhas,

     Pescoço e braços ornados com joias – todo o dia em angústia você!

 

    Muitos milhares de ninfas te ajudam. Que poder mágico este!

    Impressionante variar de um estado de sofrimento para o de benção!

 

    O que te levou a este desfazer? Qual o pecado que tu deves te arrepender?

   Por que de tuas próprias costas deves sempre comer a carne todo dia de novo?

 

     O Espírito reconheceu-o e disse, “Você não me reconhece mas fui certa vez teu capelão. Esta felicidade que gozo à noite é devida a você, como resultado de ter guardado metade de um dia de jejum; enquanto o sofrimento que experimento de dia é resultado do mal que obrava. Pois eu estava estabelecido por você na cadeira de juiz e ganhava propinas e dava falsas decisões e era caluniador e em consequência do mal que obrava de dia, agora suporto este sofrimento,” e ele pronunciou um par de estrofes:

 

        Certa vez deliciado em tradição santa, eu em operações vis estava jogado,

       Obrando o mal para meu vizinho passei através de longos anos.

 

       Aquele que amaldiçoando outros gostando de depredar seu bom nome,

      Carne de suas próprias costas sempre cortará e comerá, qual eu ho-je.

 

      E assim falando, ele perguntou ao asceta por que viera lá.  O asceta contou toda sua história extensamente. “E agora, santo senhor,” o Espírito disse, “ficarás aqui ou irás embora?”  “Não ficarei, retornarei para meu eremitério.” O Espírito disse, “Muito bem, santo senhor, eu constantemente te suprirei com uma manga madura,”  e com exercício de seu poder mágico ele o transportou para seu eremitério e pedindo que vivesse lá contente, tirou dele uma promessa e foi embora. Daí em diante o Espírito constantemente o supria com fruto de manga. O asceta, no gozo do fruto, realizou os ritos preparatórios para induzir meditação mística e foi destinado ao mundo de Brahma. 

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          O Mestre, tendo terminado esta lição ao pessoal leigo, revelou as Verdades e identificou o Jataka: - Na conclusão das Verdades, alguns atingiram o Primeiro Caminho, alguns o Segundo e outros o Terceiro Caminho: - “Naquele tempo a deusa era Uppalavanna o asceta era eu mesmo.”