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“Tive um pupilo...etc.” - Esta história o Mestre contou no Bosque de Bambu sobre Devadatra.
Nesta ocasião os Irmãos diziam a Devadatra: “Amigo Devadatra, o Supremo Buddha é teu professor ; dele aprendeste os Três Pitakas e como produzir os Quatro tipos de Ênstase ; não deves agir como inimigo de teu próprio professor!” Devadatra respondeu : “Por quê amigos – Gautama o Asceta meu professor ? Nem um pouco : não foi por meu próprio poder que aprendi os Três Pitakas e produzi os Quatro Ênstases ?” Ele recusava-se a reconhecer seu professor.
Os Irmãos ficaram falando sobre isto no Salão da Verdade. “Amigo! Devadatra repudia seu professor! Ele tornou-se inimigo do Supremo Buddha ! E que destino miserável caiu sobre ele !” O Mestre chegou e inquiriu sobre o quê conversavam. Eles disseram. “Ah, Irmãos,” disse ele, “esta não é a primeira vez que Devadatra repudia seu professor, mostra-se meu inimigo e acaba em um fim miserável. Foi justo o mesmo antes.” E então contou a seguinte história.
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Certa vez quando Brahmadatra reinava em Benares ( Varanasi ), o Bodhisatva nasceu em uma família de músicos. Seu nome era Mestre Guttila. Quando cresceu, profissionalizou-se em todos os ramos da música e sob o nome de Guttila o Músico tornou-se o chefe deles em toda a Índia. Ele não casou mas mantinha seus pais, cegos. [ n. do tr.: Guttila é uma das quatro pessoas que 'em seus corpos terrenos mesmos, atingiram a glória da cidade dos deuses.' ]
Naquele tempo certos mercadores de Benares faziam uma viagem de comércio para Ujjeni. Um feriado foi proclamado ; eles todos se reuniram ; procuraram incensos, perfumes, unções e todo tipo de comidas e carnes. “Paguem o salário,” eles gritaram, “e arranjem um músico !”
Aconteceu que naquele tempo um certo Mūsila era o chefe dos músicos em Ujjeni. Contrataram ele e o fizeram músico deles. Musila tocava violão ; e o afinava no tom mais alto para tocar. Mas eles conheciam o tocar de Guttila o Músico, e a música de Musila parecia arranhar de esteira. De modo que ninguém gostou. Quando Musila viu que não exprimiam nenhum prazer, disse para si mesmo - “Muito agudo, eu suponho,” e afinando o violão num tom médio, assim tocou. Ainda assim permaneceram sentados indiferentes. Pensou ele então, “Suponho que eles não entendem nada disto” ; e fazendo como se ele fosse também ignorante, tocou com as cordas todas soltas. Como antes, eles não deram nenhum sinal. Então Musila pergunta a eles, “Bons mercadores, por quê vocês não gostam da minha música ?”
“O quê ! Você está tocando ?” eles gritaram. “Pensávamos que você estava afinando.”
“Pois então, vocês conhecem algum músico melhor,” ele perguntou, “ou vocês são muito ignorantes para gostarem da minha música ?”
Os mercadores disseram, “Nós escutamos a música de Guttila o Músico, em Benares ; e a sua parece com a de mulheres cantarolando para fazer bebês dormirem.”
“Aqui, peguem seu dinheiro de volta,” disse ele, “não o quero. Apenas levem-me com vocês quando forem para Benares.”
Eles concordaram e levaram ele de volta para Benares com eles ; eles mostraram a casa de Guttila e cada um foi para sua casa.
Musila entrou na moradia do Bodhisatva ; viu o belo violão dele onde estava amarrado : pegou-o e tocou. Com isto os pais anciãos, que não podiam vê-lo porque eram cegos, gritaram -
“Os camundongos estão roendo o violão ! Xô! Xô! Os ratos estão mordendo o violão !”
Imediatamente Musila largou o violão e saudou os velhos pais.
“De onde você vem? “ eles perguntaram.
Ele respondeu, “Vim de Ujjeni para aprender aos pés de um professor.”
“Oh, muito bem,” eles disseram. Ele perguntou onde estava o professor.
“Ele está fora, senhor ; mas voltará ho-je,” foi a resposta. Musila sentou e esperou até que ele chegasse ; então após algumas palavras amigáveis, ele contou seu objetivo. Bem o Bodhisatva era hábil em adivinhar a partir das linhas do corpo. Ele percebeu que este não era um bom homem ; então ele recusou. “Vá, meu filho, esta arte não é para você.” Musila então abraça os pés dos pais do Bodhisatva, para que o ajudassem na sua demanda e rogou a eles - “Faça-o me ensinar !” Várias e várias vezes seus pais rogam ao Bodhisatva que faça isto ; até que ele não consegue mais aguentar e faz o quê é pedido. E Musila vai junto com o Bodhisatva para o palácio do rei.
“Quem é este, mestre ?” pergunta o rei, vendo-o.
“Um pupilo meu, grande rei !” foi a resposta.
Logo logo ele passa a ser escutado pelo rei.
Bem, o Bodhisatva não lesa seu conhecimento mas ensina seu pupilo tudo que ele mesmo sabe. Isto feito, ele diz, “Seu conhecimento está agora perfeito.”
Pensou Musila, “Agora me profissionalizei na minha arte. Esta cidade de Benares é a cidade principal de toda a Índia. Meu professor está velho ; aqui portanto devo permanecer.” Diz ele então a seu professor, “Senhor, servirei ao rei.” “Bom, meu filho,” respondeu ele, “falarei ao rei sobre isto.”
Ele foi para diante do rei e disse, “Meu pupilo está desejoso de servir sua Alteza. Fixe o salário qual será.”
O rei respondeu, “O salário dele deve ser metade do seu.” E ele voltou e contou isto a Musila. Musila disse, “S'eu receber o mesmo que tu, servirei ; mas se não, então não o servirei.”
“Por quê ?” “Diga : não sei tudo que você sabe sabe ?” “Sim, você sabe.” “Então por quê ele me oferece a metade ?”
O Bodhisatva informou ao rei o quê aconteceu. O rei disse, “S'ele é tão perfeito quanto você em sua arte, ele receberá o mesmo que tu.” Esta fala do rei o Bodhisatva contou ao pupilo. O pupilo consentiu na barganha ; e o rei, sendo informado disto, respondeu - “Muito bem. Que dia vocês vão competir, os dois ?” “Que seja no sétimo dia a partir de ho-je, ó rei.”
O rei manda chamar Musila. “Estou entendendo que você está pronto para a disputa com seu mestre ?”
“Sim, sua Majestade,” foi a resposta.
O rei tenta dissuadí-lo. “Não faça isto,” ele disse, “não deve nunca existir rivalidade entre mestre e pupilo.”
“Calma, ó rei !” gritou ele - “deixe haver uma disputa entre eu e meu professor no sétimo dia ; saberemos qual de nós é mestre em sua arte.”
Então o rei concordou ; e envia o tambor ao redor da cidade batendo com a notícia :- “Escutais! No sétimo dia Guttila o Professor e Musila o Pupilo, se encontrarão às portas do palácio real, para mostrarem suas habilidades. Que o povo da cidade se reúna para ver a habilidade deles !”
O Bodhisatva pensou consigo mesmo, “Este Musila é jovem e novo, eu sou velho e minha força já foi. O quê um homem velho faz não prospera. Se meu pupilo for vencido , não há grande crédito nisto. Se ele me vencer, morte na floresta é melhor que a vergonha que me caberá.” Então para a floresta ele foi mas ficou voltando com medo da morte e indo para a floresta com medo da vergonha. E desse jeito ele passou os seis dias. A grama morreu enquanto ele andava e seus pés fizeram um caminho.
Neste momento, o trono de Sakra ficou quente. Sakra meditou e percebeu o quê acontecia. “Guttila o Músico está sofrendo muita dor na floresta por causa do pupilo. Devo ajudá-lo !” Então ele foi rápido e ficou diante do Bodhisatva. “Mestre,” disse ele, “por quê vais para a floresta ?”
“Quem és tu ?” perguntou òutro.
“Sou Sakra.”
Então disse o Bodhisatva, “Estou temeroso de ser derrotado por meu pupilo, Ó rei dos deuses ; e por isto fujo para a floresta.” E ele repetiu a primeira estrofe :-
Tive um púpilo, que de mim aprendeu
As melodiosas trovas do violão de sete cordas ;
Ele agora anseia superar em habilidade o professor
Ó Kosiya ! me ajude !
[N. do Tr.: Kosyia quer dizer Coruja,Skr. kauçika, título de Indra, e um dos muitos clãs Indianos que são também nomes de animais.]
“Nada tema,” disse Sakra, “sou sua defesa e refúgio :” e ele repetiu a segunda estrofe :-
Nada tema pois te ajudarei na necessidade ;
Pois a honra é a recompensa justa ao professor.
Nada tema! teu púpilo não é rival para ti,
Mas provarás realmente que és melhor pessoa.
“Enquanto tocas, deves quebrar uma das cordas do teu violão e tocar só com seis ; e a música será tão boa quanto antes. Musila também deverá quebrar uma corda e ele não será capaz de fazer música com seu violão ; ele então será derrotado. E quando vires que ele está derrotado, deves quebrar uma segunda corda de teu violão, e uma terceira, até a sétima mesmo, e continuarás tocando com nada mais que o corpo ; e com as cordas quebradas o som se espalhará e preencherá toda a terra de Benares pelo espaço de doze léguas.” Com estas palavras ele deu ao Bodhisatva ao Bodhisatva três dados de jogar e continuou : “Quando o som violão tiver preenchido toda a cidade, deves jogar um destes dados para o ar ; e trezentas ninfas descerão e dançarão diante de ti. Enquanto elas dançam atire o segundo dado e trezentas dançarão em frente ao teu violão ; depois o terceiro e entao trezentas mais descerão e dançarão dentro da arena. Eu também haverei de vir com elas ; vá e nada tema !”
De manhã o Bodhisatva voltou para casa. Na porta do palácio um pavilhão foi levantado e um trono colocado à parte para o rei. Ele desceu do palácio e tomou seu lugar no divan no belo pavilhão. Ao redor dele estavam milhares de escravos, mulheres belamente vestidas, cortesãos, brahmins, cidadãos. Todo o povo da cidade se reuniu. No jardim da corte fixaram os lugares em círculos, fila após fila. O Bodhisatva, de banho tomado e ungido, comeu todo tipo de carnes finas ; e de violão na mão sentou esperando em seu lugar. Sakra estava lá, invisível, pousado no ar, cercado de uma grande companhia. Contudo o Bodhisatva o via. Musila também estava lá e sentado em seu assento. Ao redor havia um grande concurso de pessoas.
Primeiro os dois tocaram a mesma peça. Quando ambos tocaram iguais a multidão ficou deliciada e aplaudiu abundantemente. Sakra falou ao Bodhisatva do seu lugar no ar : “Quebre uma das cordas !” disse ele. Então o Bodhisatva quebrou uma corda sonora ; e a corda, apesar de quebrada, soava um som da extremidade quebrada ; parecia música divina. Musila também quebrou uma corda ; mas dela nenhum som veio. Seu professor quebrou a segunda e assim por diante até a sétima corda : ele tocava com o corpo apenas e o som continuava e preenchia a cidade :- a multidão em milhares agitavam e agitavam seus lenços nos ares e aos milhares aplaudiam. O Bodhisatva atirou um dos dados nos ares e trezentas ninfas desceram e começaram a dançar. E quando ele atirou o segundo e o terceiro do mesmo modo, passou a haver novecentas ninfas dançando como Sakra dissera. Então o rei fez um sinal para a multidão ; a multidão se levantou e gritou - “Foi um grande erro querer disputar contra teu professor ! Não conheces tua medida !” Assim gritavam contra Musila ; e com pedras e paus e com o que chegava às mãos, bateram e machucaram ele até a morte e pegando ele pelos pés, o jogaram em um monte de lixo.
O rei deliciado deu muitos presentes ao Bodhisatva e o mesmo fizeram os da cidade. Sakra do mesmo modo falou agradavelmente com ele e disse, “Sábio Senhor, enviarei daqui a pouco meu auriga Mātali com um carro puxado por um milhar de puro-sangues ; e deverás subir no meu divino carro, puxado por mil corcéis e viajar para o céu ;” e ele assim se foi.
Quando Sakra voltou e sentou em seu trono, feito todo de uma pedra preciosa, as filhas dos deuses perguntaram a ele, “Onde estavas, Ó rei ?” Sakra disse a elas tudo que acontecera e louvou as virtudes e as obras do Bodhisatva. Então as filhas dos deuses disseram,
“Ó rei, ansiamos em ver este professor ; traga ele aqui !”
Sakra chama Mātali. “As ninfas do céu,” disse ele, “desejam ver Guttila o Músico. Vá, faça-o sentar no carro divino e traga-o aqui.” O auriga foi e trouxe o Bodhisatva. Sakra deu a ele saudações amigáveis. “As filhas dos deuses,” disse ele, “desejam escutar tua música, Mestre.”
“Nós músicos, Ó grande rei,” disse ele, “vivemos da prática de nossa arte. Por uma recompensa eu tocarei.”
“Toque, que eu te recompensarei.”
“Não quero nenhuma outra recompensa do que esta : deixe que as filhas dos deuses me digam que atos de virtude as trouxeram para cá ; então eu tocarei.”
Então disseram as filhas dos deuses, “Com prazer te diremos depois que virtudes praticamos ; mas primeiro você toca para nós, Mestre.”
Pelo espaço/tempo de uma semana o Bodhisatva tocou para elas e sua música ultrapassava a música celeste. No sétimo dia ele perguntou às filhas dos deuses sobre suas vidas virtuosas, começando pela primeira. Uma delas, no tempo de Buddha Kassapa, teria dado um manto a um certo Irmão ; e tendo uma existência renovada como uma atendente de Sakra, tornou-se chefa entre as filhas dos deuses, com um séquito de um milhar de ninfas : a ela o Bodhisatva perguntou - “ O quê fizeste em uma existência prévia, que te trouxe para cá ?” O modo desta pergunta e o dom que ela dera estão contados na história de Vimāna : elas dizem como segue :-
Ó deusa brilhante, como a estrêla da manhã,
Soltando tua luz de beleza perto e longe,
De onde vem esta beleza ? de onde esta felicidade ?
De onde todas as bençãos que um coração pode abençoar-se ?
Te pergunto, deusa excelente em poder,
De onde vem esta luz maravilhosa que a tudo invade ?
Quando foste mulher mortal, que fizeste
Para ganhar a glória que te rodeia agora ?
[ A filha dos deuses respondeu :]
Chefe entre homens e chefa entre as mulheres também
Quem dá uma túnica em caridade.
Aquela que dá coisas agradáveis certo é ganhar
Uma casa divina e justa para entrar.
Veja esta habitação, como é divina !
Como fruto de minhas ações boas esta casa é minha:
Mil ninfas prontas no meu chamado ;
Belas ninfas - eu a mais bela delas.
E assim sou excelente de poder;
Daí veio esta luz maravilhosa que a tudo invade !
Outra teria ofertado flores para veneração a um Irmão que anelava ofertas. À outra foi pedido uma grinalda cheirosa de cinco ramos para um santuário e ela deu. Uma outra ofertou doces frutos. Outra, essências finas. Outra deu cinco ramos cheirosos para o santuário do Buddha Kassapa. Outra escutou o discurso dos Irmãos ou Irmãs no caminho, ou tais residiram na casa de alguma família. Outra estava na água e ofereceu água a um Irmão que comera sua refeição em um barco. Outra, vivendo no mundo fez seu dever para com o sogro e a sogra, nunca perdendo a calma. Outra dividia a parte mesmo que recebia e assim comia e era virtuosa. Outra que fora escrava em alguma propriedade, sem raiva e sem orgulho ofertava uma parte da sua porção e nasceu novamente como uma atendente do rei dos deuses. Assim também todas aquelas que estão escritas no livro da história de Guttila-vimana, trinta e sete filhas dos deuses, foram questionadas pelo Bodhisatva cada uma, o que fizera para chegar lá e elas também contaram o que fizeram do mesmo modo em versos.
Escutando tudo isto, o Bodhisatva exclamou : “É bom para mim, em verdade, verdadeiramente é muito bom para mim, ter vindo aqui e escutado como méritos tão pequenos alcançaram grande glória. Portanto, quando eu voltar para o mundo dos homens, darei todo tipo de presentes e realizarei obras boas.” E ele pronunciou esta aspiração :-
Ó, feliz aurora ! Ó, feliz eu devo ser !
Ó feliz peregrinação, onde vejo
Estas filhas dos deuses, divinamente belas,
E ouço suas falas doces ! De agora em diantre juro
Pleno de doce paz, e generosidade,
De temperança e verdade será minha vida,
Até que eu vá para onde não há tristeza.
Então após passarem sete dias, o rei do céu deu ordem a seu auriga Matali e ele sentou Guttila no carro e enviou-o para Benares. E quando ele chegou em Benares, contou ao povo o quê vira com seus próprios olhos no céu. A partir daquele momento o povo resolveu fazer boas ações com todas suas forças.
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Quando o discurso estava terminado, o Mestre identificou o Jataka : “Naqueles dias Devadatra era Musila, Anurudha era Sakra, Ananda era o rei e eu era Guttila o Músico.”
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