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“Agora me recordo...etc.” - Esta história o Mestre contou em Jetavana sobre um homem irascível. Aprendemos que havia um Irmão que era cheio de amargura. Não importava quão pouco lhe era dito, ele ficava furioso e falava rudemente ; mostrando ira, ódio e desconfiança. No Salão da Verdade os Irmãos discutiam o assunto. “Amigo, como é raivoso e amargo Irmão Tal-e-tal ! Ele vive brigando com todo mundo como sal no fogo. Apesar de ter adotado esta religião pacífica, ainda assim ele não consegue conter sua raiva.” O Mestre escutou isto e enviou um irmão na busca do sujeito em questão. “És realmente irascível como dizem ?” ele perguntou. O homem disse que era. Então o Mestre continuou, “Esta não é a primeira vez, Irmãos, que este homem é irascível. Ele era justo o mesmo antes ;” e contou a eles um conto do mundo antigo.
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Certa vez Brahmadatra o rei de Benares ( Varanasi ) teve um filho chamado Príncipe Brahmadatra. Bem, reis de tempos anteriores, ainda que houvessem professores famosos em sua própria cidade, geralmente enviavam seus filhos para países distantes de modo a completarem sua educação, para que por este meio eles fossem capazes de aprender a por fim ao orgulho e a arrogância, a suportar calor e frio, e a ficarem cônscios dos caminhos do mundo. Assim fez o rei. Chamando este garoto até ele – que estava então com dezesseis anos – deu a ele sandálias sem saltos, um parassol de folhas e mil peças de dinheiro, com estas palavras : “Meu filho, vá para Takkasilā ( Taxila ) e lá estude.”
O garoto obedeceu. Ele se despediu dos pais e no curso devido chegou a Takkasila. Lá perguntou pela morada do professor e chegou nela no momento em que o professor tendo acabado a lição, andava para cima e para baixo na porta da casa. Quando o rapaz colocou os olhos no professor, ele soltou as sandálias, fechou o parassol e com uma saudação respeitável permaneceu de pé onde estava. O professor viu que ele estava extenuado e deu boas-vindas ao que chegava. O rapaz comeu e descansou um pouco. Então retornou ao professor e permaneceu respeitosamente diante dele.
“De onde você veio ?” ele perguntou.
“De Benares.”
“Você é filho de quem?”
“Sou filho do rei de Benares.”
“O quê traz você aqui ?”
“Vim para aprender,” respondeu o rapaz.
“Bem, você trouxe o pagamento do professor ? Ou você deseja me ajudar em troca da aprendizagem ?”
“Trouxe o dinheiro comigo :” e com isto colocou aos pés do professor sua bolsa com mil moedas.
Os pupilos (alunos) residentes ajudavam o professor de dia e à noite ele aprendiam dele : mas aqueles que traziam dinheiro eram tratados como filhos mais velhos na casa e também aprendiam. E este professor, como o resto, ensinava o príncipe todo santo dia. Assim o jovem príncipe foi ensinado.
Bem, um dia ele foi se banhar junto com seu professor. Havia uma velha mulher, que preparara algumas sementes brancas e as espalhara no lado de fora diante dela : lá ela senta, vigiando-as. O jovem vê estas sementes brancas e deseja comê-las ; ele pega a mancheia e as come.
“Aquele rapaz lá deve estar faminto,” ela pensou ; mas nada disse e senta em silêncio.
Dia seguinte na mesma hora aconteceu a mesma coisa. Novamente a mulher não disse nada para ele. No terceiro dia, ele fez novamente ; a velha dama então gritou dizendo,
“O grande Professor está deixando seus pupilos me roubarem !” e levantando seus braços passou a se lamentar.
O Professor foi até lá atrás. “O que há, senhora ?” ele perguntou.
“Mestre, eu estava secando algumas sementes e teu pupilo pegou a mancheia e as comeu ! Ele fez isto ho-je, fez ontem e fez ainda antes de ontem ! Certamente ele vai me comer a casa toda !”
“Não chore, senhora : farei como que sejas ressarcida.”
“Ah, não quero pagamento, mestre : apenas ensine a teu pupilo a não fazer isto novamente.”
“Veja então, senhora,” disse ele ; e fez com que dois rapazes trouxessem o jovem companheiro pelas mãos e bateu nele três vezes nas costas com uma vara de bambu, mandando-o que não fizesse aquilo novamente.
O príncipe ficou irado com o professor. Com olhar cheio de sangue, o contemplou dos pés à cabeça. O professor observou como ele estava irado e como olhou para ele.
O jovem dedicou-se a seu trabalho e terminou seus cursos. Mas a ofensa ele guardou escondida no coração, determinado a matar seu professor. Quando chegou o tempo dele ir embora, disse a ele, “Ó Professor, quando eu receber o reino de Benares, mandarei te chamar. Então venha até mim, te peço.” E assim ele arrancou uma promessa com mais afecção ainda.
Ele voltou para Benares, visitou seus pais e deu provas do quê aprendera. Disse o rei, “Estou vivo para ver meu filho novamente e enquanto ainda estou vivo, verei a magnificência de sua legislatura.” E assim fez seu filho rei no seu lugar.
Quando o príncipe gozava do esplendor da realeza, lembrou-se do seu rancor e cólera levantou-se dentro dele. “Darei morte àquele sujeito !” ele pensou e mandou um mensageiro buscar seu professor.
“Nunca serei capaz de apaziguá-lo enquanto ele é jovem,” pensou o professor ; e assim não foi. Mas quando o tempo da legislatura do príncipe estava na metade, pensou que poderia apaziguá-lo então ; e ele foi e permaneceu à porta do rei, mandando dizer que o professor de Takkasilā tinha chegado. O rei ficou feliz e fez com que o brahmin fosse introduzido. Sua ira então levantou-se e seus olhos ficaram vermelhos de sangue. Ele acenou para aqueles ao seu redor. “Ah, o lugar em que meu professor me bateu ainda dói ho-je ! Ele veio aqui com a morte escrita na testa, para morrer ! Ho-je a vida dele deve terminar !” e repetiu os primeiros dois versos :-
Agora me recordo, por poucas sementes, em dias atrás
Você me segurou pelos braços e me deu chicotadas dolorosas
Brahmin, amas a morte, nada temes
Por me segurar e me bater e agora aventurar-se aqui ?
Assim ele o ameaçava de morte . Depois que escutou, o professor pronunciou o terceiro verso :-
O bem nutrido costuma por fim a tapas mal nutridos -
Isto é correta disciplina, não ira: o sábio saboreia isto tudo.
“Assim, grande rei, entenda isto você mesmo. Saiba que esta não é causa justa de cólera. Na realidade se não tivesses aprendido esta lição comigo, terias continuado apanhando bolos e doces, frutos e semelhantes, até te tornares ganancioso devido a estes gestos de furto ; então lentamente serias levado a assaltar casas, roubar nas estradas e assassinar nas cidades ; no fim, serias apanhado em flagrante e acusado diante do rei como inimigo público e ladrão ; e temerias punição pública, quando o rei dissesse, 'Levem este homem e o punam de acordo com seus crimes.' De onde pode ter vindo toda esta prosperidade que agora gozas ? Não foi através de mim que atingiste tal magnificência ?”
Assim o professor falou com o rei. E os cortesãos, que estavam ao redor, disseram quando escutaram esta fala, “É verdade, meu senhor, toda sua magnificência realmente pertence a teu professor !”
No mesmo momento o rei reconheceu a bondade de seu professor e disse a ele, “Todo meu poder eu ofereço a você, meu professor ! Receba o reino !”
Mas o outro recusou, dizendo, “Não, meu senhor rei ; não tenho nenhum desejo pelo reino.”
E o rei mandou chamar a esposa e a família do professor em Takkasilā ; deu a ele grande poder e o fez sacerdote real ; tratando-o como um pai e obedecendo seus conselhos ; e após dar presentes e fazer obras boas tornou-se destinado ao paraíso.
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Quando o Mestre terminou este discurso, declarou as Verdades :- na conclusão das Verdades o irmão irascível atingiu o Fruto do Terceiro Caminho e muitos outros entraram no Primeiro, ou no Segundo ou Terceiro : - “Naquele tempo o Irmão irascível era o rei ; mas o Professor era eu mesmo.”
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