sexta-feira, 12 de abril de 2024

512 Buddha Sakra

 



                                         Mulher com espelho. Imagem de Ajanta, Índia


512            Kumbha Jataka

 

       “Quem és tu ....etc.” –  Esta história o Mestre contou enquanto residia em Jetavana relativa as quinhentas mulheres amigas de Visakha, que bebiam  bebida forte. Bem, a história diz que foi proclamado em Savatthi um festival de bebida e estas quinhentas mulheres, após providenciarem bebida ardente para seus maridos, no final do festival pensaram, “Nós também vamos guardar a festa,” e elas todas foram até Visakha e disseram, “Amiga, nós vamos guardar a festa.” Ela respondeu, “Este é um festival de bebida; eu não bebo bebida forte.” Elas disseram, “Você então dê uma oferta ao supremo Buddha: nós guardaremos a festa.” Ela prontamente assentiu e as mandou embora. E após entreter o Mestre e fazer a ele uma larga oferta, ela saiu ao crepúsculo para Jetavana com muitas guirlandas perfumadas na mão, para escutar a pregação da Lei, sendo seguida por estas mulheres. Bem, elas estavam ansiosas para beber, quando partiram com ela e quando permaneciam na câmara oitanada, elas tomaram bebida forte e então  acompanharam Visakha na presença do Mestre. Visakha saudou o Mestre e sentou respeitosamente em um dos lados. Algumas da mulheres dançaram até diante do Mestre; algumas cantaram; outras fizeram movimentos impróprios com as mãos e os pés; outras discutiam. O Mestre de modo a dar um choque nelas, emitiu um raio  de luz da sua sobrancelha; e isto foi seguido de escuridão cega. Estas mulheres foram aterrorizadas e amedrontadas com o medo da morte e assim o efeito da bebida forte passou. O Mestre, desaparecendo do trono em que estava sentado, tomou sua posição no topo do Monte Sineru e emitiu um raio de luz dos cabelos entre as sobrancelhas, como se fosse a elevação de mil luas. O Mestre enquanto estava lá, para produzir um sentimento entre estas mulheres, falou esta estrofe:

 

                    Não há lugar para riso aqui, nem espaço para prazer,

                As chamas da paixão, os mundos de sofrimento destroem.

                    Por que, envolvido na mais escura noite, eu pergunto

             Vocês não buscam uma tocha que as iluminem no seu caminho? 

            No final desta estrofe todas as quinhentas mulheres foram estabelecidas na fruição do Primeiro Caminho.  O Mestre veio e sentou-se no assento de Buddha, na sombra da Câmara Perfumada. Então Visakha o saudou e perguntou, “Santo senhor, quando surgiu este beber bebida forte, que avilta a honra do ser humano e sua tenra consciência  ?” E  contando para ela e relatou uma história do passado. 

                                   ________________________         

 

               Certa  vez quando Brahmadatra reinava em Benares, um mateiro chamado Sura, que residia no reino de Kasi, foi para os Himalaias, em busca de artigos para fazer comércio. Havia uma certa árvore lá que espalhava-se na altura de um ser humano com os braços estendidos acima da cabeça e então dividia-se em três partes. No meio das três forquilhas havia um buraco grande como um jarro de vinho e quando chovia este buraco enchia-se de água.  Ao redor dele crescia duas plantas myrobalans ( Terminalia Chebula e Emblica officinalis ) e um arbusto de pimenta ; e os frutos maduros destes, quando se quebravam caíam dentro do buraco. Não distante desta árvore havia algum arroz selvagem. Os papagaios arrancavam as cabeças do arroz e as comiam pendurados nesta árvore. E enquanto eles estavam comendo o arroz com e sem casca caía lá. Assim, àgua, fermentando com o calor do Sol, assumia uma cor vermelho sangue. Na estação quente, bandos de pássaros, estando sedentos, bebiam ali, e intoxicando-se caíam aos pés d’árvore e após dormirem um pouco voavam embora gorjeando alegremente. E a mesma coisa acontecia com os cães selvagens, macacos e outras criaturas. O mateiro, vendo isto, disse, “Se fosse veneno eles morreriam mas após um sono curto vão embora como querem ; não é veneno.” E ele mesmo bebeu do buraco e tornando-se intoxicado ficou com desejo de comer carne e então fazendo um fogo ele matou as perdizes e galos que caíam ao pé d’árvore e assou a carne deles em carvão ardente e gesticulando com uma mão e comendo carne com a outra ele permaneceu um ou dois dias no mesmo lugar.  Não distante deste lugar vivia um asceta de nome Varuna. O mateiro em outras vezes costumava visitá-lo e um pensamento o atingiu então, “Beberei este licor com o asceta.”  Encheu um tubo de bambu com ele e levando junto alguma carne tostada veio para a cabana de folhas e disse, “Santo senhor, prove este licor,” e ambos beberam dele e comeram a carne.  Assim do fato desta bebida ter sido descoberta por Sura e Varuna ela foi chamada pelo nome deles ( sura e varuni ). Ambos pensaram, “Este é o jeito de lidar com isto,” e encheram seus tubos de bambu e pendurando numa vara chegaram numa vila da fronteira e enviaram mensagem para o rei que alguns mercadores de vinho  tinham chegado. O rei mandou chamá-los e eles ofereceram a ele a bebida. O rei a bebeu duas ou três vezes e ficou intoxicado. Isto durou nele um ou dois dias. Então ele perguntou a eles se havia mais. “Sim senhor,” eles disseram. “Onde?” “Nos Himalaias, senhor.” “Então tragam para cá.” Eles foram e colheram o líquido duas ou três vezes. Então pensando, “Não podemos ficar sempre indo lá,” tomaram nota de todas as partes constituintes e começando com a casca d’árvore, eles reuniram todos os outros ingredientes e fizeram a bebida na cidade. Os homens da cidade beberam dela e tornaram-se desgraçados indolentes. E o lugar tornou-se como uma cidade deserta. Então estes mercadores de vinho fugiram dela e vieram para Benares e enviaram mensagem para o rei anunciando a sua chegada. O rei mandou chama-los e deu-lhes dinheiro e eles fizeram vinho lá também. E esta cidade também pereceu do mesmo modo. Então fugiram para Saketa e de Saketa eles foram para Savatthi. Naquele tempo havia um rei chamado Sabbamitta em Savatthi. Ele mostrou favor para estes homens e perguntou-lhes o que queriam. Quando eles disseram, “Queremos os ingredientes principais e arroz da terra e quinhentos cântaros,” ele deu a eles tudo o que pediram. Então armazenaram o licor em quinhentos cântaros e para guardá-los amarraram gatos um em cada cântaro. E quando o licor fermentou e começou a escapar, os gatos beberam a bebida forte que fluía de dentro dos cântaros e ficando intoxicados deitaram dormindo; e o ratos vieram e roeram os ouvidos, narizes, dentes e rabos. Os oficiais do rei vieram e contaram a ele , “Os gatos morreram porque beberam o licor.” O rei disse, “Certamente estes homens devem ser produtores de veneno,” e ordenou que ambos fossem decapitados e eles morreram gritando, “Dê-nos bebida forte, dê-nos hidromel” ( outra leitura é, ‘Vinho, Ó rei, hidromel, Ó rei’). O rei, após ter matado os homens, deu ordens para que os cântaros fossem quebrados. Mas os gatos, quando o efeito do licor passou, levantaram andaram ao redor e brincaram.  Quando viram isto , falaram para o rei. O rei disse, “Se fosse veneno eles teriam morrido; deve ser hidromel; beberemos dele.”  Então decorou a cidade e levantou um pavilhão no jardim do palácio e tomando seu lugar neste esplêndido pavilhão em um trono real com parassol branco levantando sobre ele e cercado por seus cortesãos, começou a beber. Então Sakra, o rei do céu, disse, “Quem há que no dever do serviço para mãe e semelhantes diligentemente cumpre os três tipos de reta conduta?” E, olhando o mundo, ele viu o rei sentado para beber bebida forte e ele pensou, “Se ele beber bebida forte toda a Índia perecerá: verei para que ele não a beba.”  Então, colocando um cântaro cheio de licor na palma da sua mão, ele foi, disfarçado como um brahmin e permaneceu nos ares, na presença do rei e gritou, “Compre este cântaro, compre este cântaro.”  Rei Sabbamitta, vendo-o pousado nos ares, falando deste jeito, disse, “De onde pode ter vindo este brahmin?” e conversando  com ele repetiu três estrofes: 

 

                     Quem és tu, Ser das alturas,

                     Cuja forma emite raios de luz brilhantes,

                     Qual vívido raio através do céu,

                        Ou lua iluminando a mais escura noite?

 

                   Viajar sobre os ares sem caminhos,

                       Mover-se ou permanecer no espaço silencioso –

                   Real é o poder que tu hás ganhado,

                     E prova que és de raça divina.

 

                  Então, brahmin, declare quem és tu,

                      E o que dentro de teu cântaro pode haver,

                  Que assim aparecendo no meio dos ares,

                       Tu anseias em vender tua mercadoria para mim.

 

             Então Sakra disse, “Me escute então,” e expondo as más qualidades da bebida forte, ele disse:

         

                    Este jarro não sustenta nem óleo nem ghee,

                        Nem mel nem melado aqui,

                   Mas vícios maiores do que podem ser ditos

                      Estão armazenados dentro de suas redondas curvas.

 

                     Aquele que beber cairá, pobre tolo idiota,

                        Dentro de algum buraco ou poço impuro,

                    Ou de cabeça para baixo afundará em um poço de sujeira

                          E comerá o que disposto abjura.

                    Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

                   Aquele que bebe, com os sentidos todos distraídos,

                       Qual gado pastando que ama se extraviar,

                   Vaga a mente, uma criatura sem amparo,

                       E canta e dança todo o dia.

                Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

                  Aquele que bebe correrá tudo sem nenhuma vergonha,

                     Como o asceta nu através da cidade,

                  E tarde toma descanso – tão tonto ele está –

                      Esquecendo quando deitar-se.

                Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

                 Aquele que bebe, como alguém que move-se assustado,

                         Cambaleia como se não pudesse ficar de pé,

                E, tremendo, balança cabeça e braços,

                       Qual boneco de madeira com as mãos movido. 

                Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

                Aqueles que bebem queimam até a morte na cama,

                    Ou então caem presas de chacais,

                São levados para prisão ou para morte,

                     E sofrem perda dos bens também.

              Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

             Aquele que bebe perde a decência

                    E fala de coisas que são obscenas,

             Sentará sem roupa numa reunião,

                   Está doente e de todo modo impuro.

             Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

               Elevado está o homem que bebe,

                    Sua visão de modo algum é clara,

              O mundo é todo meu, ele pensa,

                   Não sou páreo para nenhum senhor de terra.

             Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

            Vinho é uma coisa de orgulho assoberbado,

                  Um diabo feio, nu e covarde,

             Aliado da discórdia e da calúnia,

                     Uma casa que abriga ladrão e alcoviteiro.

            Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

            Apesar das famílias poderem ser ricas,

                    E gozarem de tesouros incontáveis,

            Tendo em feudo os mais ricos dons da terra,

                Isto destruirá sua herança.

             Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

            Prata e ouro e utensílios domésticos,

                 Gado, campos e celeiros de grãos –

            Tudo, tudo é perdido: bebida forte, eu temo,

                Está provada ser, da riqueza da casa, o veneno.

             Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

          O homem que bebe está cheio de orgulho,

                E a seus próprios pais insultará,

          Ou, laços de sangue e parentesco desafiará,

                Ousará a cama de casamento desonrar.

          Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

          Aquela que bebe também em seu orgulho

                  Insultará pai e marido,

          E a dignidade da raça desafiará,

                Escrava da loucura, enganará.

         Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

             O homem que bebe ousará matar

                   Um padre correto ou um brahmin verdadeiro,

             E então em mundos de sofrimento para sempre

                 O ato de pecado terá de lamentar.

             Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

           Aqueles que bebem errarão de três maneiras,

                Pela palavra, pela ação e pelo pensamento,

           Então afundam no Ínfero, para agonizar

                 Por todo o mal que obraram.

           Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

          O homem de quem as pessoas pedem em vão,

                 Mesmo ao preço de montes de ouro,

          Dele quando bêbado seu pedido eles ganham

                E prontamente a mentira é contada.

          Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

          Alguém que bebe deve levar uma mensagem

                  E olhe! Uma grande emergência

           Surge de repente, ele vai praguejar

                  A coisa fugiu de sua memória.

          Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                   Cheio até a borda do vinho mais forte.

              Mesmo o Povo humilde, intoxicado

                     Com vinho, se tornará o mais indecente,

              E o mais sábio dos homens, quando bêbado, tagalerá

                    E murmurará bem tolamente.

              Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

                Através da bebida as pessoas, jejuando, deitam,

                    A dura terra nua seu lugar de descanso,

                Amontoados como porcos, um ajuntamento sem vergonha,

                   Eles suportam a desgraça mais imunda.

                Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

               Qual gado abatido até o chão

                    Caídos, aos montes eles jazem;

                Tal fogo é encontrado na bebida alcóolica,

                    Nenhum poder humano rivaliza com ela.

               Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

               Quando todas as pessoas, como de serpente mortífera,

                      Aterrorizadas com o veneno fogem,

               Que herói é corajoso o suficiente para matar

                      Sua sede com tal drinque fatal?

               Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

                Foi após beber isto, eu suponho,

                     Que a raça dos Andhakas e de Vrishni,

                Vagando pelas costas, foram vistas

                        Cair, todas pelo porrete de seus parentes.

                Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

               Anjos enfatuados de vinho

                      Caíram do céu eterno, Ó rei,

               Com todo seu poder mágico divino:

                     Então quem provaria esta coisa amaldiçoada?

               Compre então, Ó rei, este meu cântaro,

                     Cheio até a borda do vinho mais forte.

 

               Nem coalhada nem o doce mel estão aqui,

                     Mas lembre-se sempre

                O que está guardado dentro destas curvas redondas,

                     Compre, compre meu cântaro, Ó rei.

 

    Escutando isto o rei, reconhecendo a miséria causada pela bebida, ficou tão agraciado com Sakra que cantou seus louvores em duas estrofes:

 

                    Não tenho pais sábios que ensinem como tu,

                    Mas tu és gentil e misericordioso, eu vejo;

                    Buscador da Mais Alta Verdade de todo modo;

                    Portanto obedecerei tuas palavras ho-je.

 

                   Olhe! Cinco cidades escolhidas que tenho são tuas,

                   Duas vezes cinquenta empregadas, sete centenas de gado,

                   E estes dez carros com corcéis do mais puro sangue,

                   Pois tu me aconselhaste para meu próprio bem.

 

      Sakra escutando isto revelou sua divindade e se fez conhecido e permanecendo nos ares ele repetiu duas estrofes:

 

                   Estas centenas de escravas, Ó rei, podem ficar contigo.

                   E também as cidades e os rebanhos de gado;

                   Não quero charretes puxadas por corcéis puro sangue;

                   Sakra, chefe dos Trinta e Três deuses, é meu nome.

 

                    Goze de teu ghee, arroz, leite e carne mal passada,

                   Fique ainda contente ao comer teus pães de mel.

                   Assim, rei, deliciando-me nas Verdades preguei,

                   Continue teu caminho sem culpa, até alcançar o Céu.

 

    Assim Sakra o advertiu e então retornou para seu domicílio no Céu. E o rei, abstendo-se de bebida forte, ordenou que os cântaros de bebida fossem quebrados. E encarregando-se de manter os preceitos e de dar esmolas, tronou-se destinado ao Céu. Mas o beber bebida forte gradualmente desenvolveu-se na Índia.

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           O Mestre aqui terminou sua lição  e identificou o Jataka: “Naquele tempo Ananda era o rei e eu mesmo era Sakra.”              

         


quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

511 Buddha rei de Benares

 



511           Kimchanda jataka

 

          “Por que tu...etc.” – Esta história o Mestre contou enquanto residia em Jetavana sobre a observância de dias de jejum.

        Bem, um dia quando um número de Irmãos e Irmãs leigos, que estavam guardando dia de jejum, vieram escutar a Lei e estavam sentados no Salão da Verdade, o Mestre perguntou a eles se estava guardando dias de jejum e quando eles disseram que estavam, ele adicionou, “Vocês fazem bem em observar dias de jejum: homens antigos, em consequência de guardarem metade de um dia de jejum, atingiram grande glória,” e com o pedido deles ele contou um conto do passado.

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           Certa vez em Benares, Brahmadatra reinava em seu reino com retidão e sendo crente era zeloso na observância dos deveres do dia de jejum, em guardar os mandamentos e em dar esmola. Ele também induziu seus ministros e os outros para que fizessem votos de castidade e semelhantes. Mas seu capelão era caluniador, ganancioso de subornos e um produtor de julgamentos injustos. O rei no dia de jejum reuniu seus conselheiros e pediu-lhes que guardassem o jejum. O sacerdote não guardou consigo mesmo os deveres do jejum; então durante o dia esteve recebendo propinas e dando falsos julgamentos e quando foi para a corte prestar respeito ao rei, o rei, após perguntar a cada um de seus ministros primeiro se estavam guardando o jejum, questionou também o sacerdote, dizendo, “E estás tu, Senhor, jejuando?” Ele contou uma mentira e disse “Sim” e deixou o palácio. Um certo ministro o censurou dizendo, “Certamente você não está guardando o jejum.” Ele respondeu, “Me alimentei cedo de manhã mas quando voltar para casa vou enxaguar a boca e guardando comigo mesmo os deveres do dia de jejum não comerei nada à noite e toda a noite guardarei a lei moral e desde modo guardarei metade de um dia de jejum.” “Muito bem, Senhor”, disseram. E ele foi para casa e fez isto.  Bem, um dia enquanto ele estava sentado em julgamento, uma certa mulher, que guardava os preceitos morais, tinha um caso em julgamento e não sendo capaz de ir para casa, ela pensou, “Não transgredirei a observância do dia de jejum,” e quando aproximava-se o tempo ela passou a enxaguar sua boca. Naquele momento uma penca de mangas maduras foi trazida para o brahmin. Ele percebeu que a mulher estava guardando jejum e disse, “Coma isto e assim guarde o jejum.” Ela fez isto. Basta de ações do brahmin. Logo logo ele morreu e nasceu novamente no país Himalaia em um lugar adorável na margem do ramo Kosibi do Ganges, em um bosque de mangas, extenso três léguas, em uma esplêndida cama real de um palácio dourado.  Ele nasceu novamente como alguém que acabou de acordar do sono, bem vestido e adornado, com muita beleza de forma e acompanhado de dezesseis mil ninfas. Durante toda a noite ele gozou desta glória de nascer qual Espírito em uma aparição de palácio, seu prêmio correspondente a seu ato. Então ao se aproximar a aurora ele entrou no bosque de manga e no momento de sua entrada seu corpo divino desapareceu e ele assume uma forma tão alta quanto uma palmeira, oitenta cúbitos de altura, e todo seu corpo queima como uma árvore da judeia em plena floração. Tinha apenas um dedo em cada mão, enquanto suas unhas eram grandes quais enxadas e com estas unhas ele cravava a carne nas suas costas e rasgava ela e comia, e louco com a dor que sofria, pronunciava um alto grito. Ao crepúsculo este corpo desaparecia e sua divina forma reaparecia. As garotas dançarinas celestes, com vários instrumentos musicais em suas mãos, o atendiam e gozando de grande honra ele ascende para o palácio divino em um encantador bosque de manga. Assim ele, como resultado de dar uma manga a uma mulher que guardava jejum, adquiriu um bosque de manga, três léguas de extensão, mas em consequência de receber propinas e produzir falsos julgamentos, ele rasga e come a carne de sua própria costa, enquanto devido ao fato de ter guardado meio dia de jejum, ele goza de glória durante a noite, cercado por um harém de dezesseis mil ninfas dançantes. 

                Neste tempo o rei de Benares, cônscio dos pecados dos desejos, adotou a vida ascética e fixou residência em uma cabana de folhas, em um lugar agradável no baixo Ganges, subsistindo do que catava, colhia. Um dia uma manga madura daquele bosque, do tamanho de uma tigela grande, caiu no Ganges e foi levada pela corrente ao lugar oposto ao que estava residindo este asceta. Enquanto ele enxaguava a boca, viu a manga flutuando no meio da corrente e atravessando ele a pegou, a trouxe para seu eremitério e a colocou na cela onde seu fogo sagrado era mantido. Então, cortando a manga com uma faca, ele comeu justo apenas para sustentar a vida e cobrindo o resto com folhas de bananeira, ele repetidamente, dia após dia, comeu da fruta, enquanto ela durou. E quando já estava toda consumida, ele não conseguia comer nenhum outro tipo de fruta mas tornando-se escravo do seu apetite por gostosuras, ele fez o voto de apenas comer manga madura e descendo a margem do rio ele sentou olhando a corrente, determinado a nunca mais levantar-se até que tivesse encontrado manga. Lá jejuou por seis dias consecutivos e sentado procurava o fruto até que estava seco pelo vento e pelo calor. Bem, no sétimo dia uma deusa do rio, refletindo sobre o assunto, entendeu a razão da ação dele e pensando, “Este asceta, sendo escravo de seu apetite, está sentado jejuando por sete dias, olhando para o Ganges: é errado negar a ele uma manga madura: pois sem ela ele morrerá; darei uma a ele.” Então ela veio e permaneceu nos ares acima do Ganges e conversando com ele pronunciou a primeira estrofe:

    

         Por que tu permaneces nesta margem de rio durante o calor do verão?

              Brahmin, qual tua esperança secreta? Que objetivo alcançarias?

 

      O asceta escutando isto repetiu nove estrofes:

 

       Boiando na corrente, bela ninfa, uma manga eu vi;

       Esticando o braço peguei a fruta e a trouxe para casa comigo.

 

      Tão doce era de gosto e de cheiro, que a considerei um prêmio e tanto;

      Sua bela forma compara-se com o maior jarro de água em tamanho.

 

     A escondi no meio de folhas de bananeira e a fatiava com uma faca;

    Um pouco serve de comida e de bebida a alguém de vida simples.

 

    Meu estoque acabou, minha angústia apaziguou mas ainda devo me afligir

    Em outros frutos que possa encontrar, não tenho nenhum contentamento.     

     

    Sofro; aquela doçura da manga que resgatei das ondas

    Trará minha morte, temo. Não anelo nenhum outro fruto.

 

   Te contei porque jejuo, apesar de residir ao lado de um rio

   Cujas largas ondas pululam com todos os peixes nadando.

 

  E agora te peço diga-me e não fujas atemorizada

  Ó amável donzela, quem és tu e por que estás aqui.

 

  Belas são as criadas dos deuses, como ouro cor de fogo elas são,

  Graciosas qual filhote de tigre brincando nas encostas das montanhas.

 

  Aqui também no mundo das pessoas as mulheres são belas de ver,

  Mas nenhuma entre os deuses ou as pessoas pode ser comparada contigo.

  Pergunto a ti então, Ó amável ninfa, dotada de graça celeste,

  Declare-me teu nome e parentesco e de onde deriva tua raça.

 

           Então a deusa pronunciou oito estrofes: 

 

   Por esta bela corrente, ao lado da qual tu sentas, Ó brahmin, eu presido,

  E resido abaixo nas vastas profundezas, sob as ondas que rolam do Ganges.

 

  Toda protegida com floresta crescida tenho mil cavernas nas montanhas,

  De onde flui igual número de rios que misturam-se com minhas ondas.

 

  Cada bosque e floresta, caras aos Nagas, enviam muitos riachos cheios,

  E entregam seus estoques de águas azuis, enchendo meu amplo curso.

 

  Geralmente carregados nestes rios tributários são frutos de todas as árvores,

  Jambos, fruta-pão, castanhas e figos, com mangas pode-se ver.

 

  E tudo que cresce em ambas as margens e cai dentro do meu alcance,

  Clamo como prêmio de direito e ninguém meu título pode impedir. 

 

  Sabendo disto, me escute, Ó sábio e estudado rei,

  Pare de ser indulgente com desejo do teu coração – renuncie a coisa maldita.

 

  Ó legislador primeiro de amplos domínios, não posso louvar teu ato,

  Desejar a morte, no começo da juventude, grande loucura, certamente, denuncia.

 

  Brahmins e anjos, deuses e pessoas, todos conhecem teus atos e nome,

  E santos que por sua santidade atingiram na terra a fama –

  Sim, todos estes sábios e famosos, proclamam teu ato de pecado. 

 

        Então o asceta pronunciou quatro estrofes:

 

     Alguém que saiba quão frágil é nossa vida e quão transitórias as coisas dos sentidos,

     Nunca pensa em matar a outro mas reside na inocência.

 

    Honrada antes por santos em conselho, dona de um nome virtuoso,

   Agora conversando com pessoas pecadoras, tu ganharás má fama.

 

   Se eu morresse em tuas margens, ninfa dotada de bela forma,

   Má reputação cairia sobre ti, como a sombra de uma nuvem.

 

   Portanto, bela deusa, peço a ti, se afaste de todo ato vil,

   Para que não tenhas, pelo ditado do Povo, que lamentar que causaste minha morte.

           

      Escutando isto, a deusa respondeu em cinco estrofes:

 

   Bem, eu sei o teu desejo secreto tão pacientemente carregado,

   E faço de mim mesma tua serva dando para ti a manga.

   Olhe! Prazeres vis anteriores, prazeres difíceis de serem abandonados,

   Tu ganhaste, manter para sempre, santidade e paz da mente.

 

  Aquele que, liberto de laços anteriores, abraça grilhões que antes abjurou,

 Duramente trilhando caminhos não santos, sempre peca mais e mais.

 

 Te darei teu desejo anelado e farei teus problemas cessarem,

 Te levando a lugares legais, onde possas habitar em paz.

 

  Garças, pássaros maynah e cucos, com os gansos vermelhos que amam

  Pegar néctar das flores, cisnes que movem-se em tropas,

  Pássaros dos arrozais e senhores pavões, com suas canções acordam o bosque.

 

  Flores kadamba e açafrão descansam qual palha no chão,

  Castanhas maduras, palmeiras adornando, penduradas em pencas ao redor,

  E, no meio de galhos carregados, veja como mangas aqui abundam!

 

       E cantando os louvores do lugar ela transportou o asceta para lá, e mandando a ele que comesse manga neste bosque até saciar sua fome, ela seguiu seu caminho. O asceta, comendo mangas até ter apaziguado seu apetite, descansou um pouco. Então, enquanto ele vagava pelo bosque, espreitou o Espírito no estado de sofrimento e não teve coração para pronunciar uma palavra para ele mas ao crepúsculo ele o viu sendo ajudado pelas ninfas e no gozo de glória celeste e dirigiu-se a ele em três estrofes:

 

      Toda a noite ungido, festejando, com uma coroa nas sobrancelhas,

     Pescoço e braços ornados com joias – todo o dia em angústia você!

 

    Muitos milhares de ninfas te ajudam. Que poder mágico este!

    Impressionante variar de um estado de sofrimento para o de benção!

 

    O que te levou a este desfazer? Qual o pecado que tu deves te arrepender?

   Por que de tuas próprias costas deves sempre comer a carne todo dia de novo?

 

     O Espírito reconheceu-o e disse, “Você não me reconhece mas fui certa vez teu capelão. Esta felicidade que gozo à noite é devida a você, como resultado de ter guardado metade de um dia de jejum; enquanto o sofrimento que experimento de dia é resultado do mal que obrava. Pois eu estava estabelecido por você na cadeira de juiz e ganhava propinas e dava falsas decisões e era caluniador e em consequência do mal que obrava de dia, agora suporto este sofrimento,” e ele pronunciou um par de estrofes:

 

        Certa vez deliciado em tradição santa, eu em operações vis estava jogado,

       Obrando o mal para meu vizinho passei através de longos anos.

 

       Aquele que amaldiçoando outros gostando de depredar seu bom nome,

      Carne de suas próprias costas sempre cortará e comerá, qual eu ho-je.

 

      E assim falando, ele perguntou ao asceta por que viera lá.  O asceta contou toda sua história extensamente. “E agora, santo senhor,” o Espírito disse, “ficarás aqui ou irás embora?”  “Não ficarei, retornarei para meu eremitério.” O Espírito disse, “Muito bem, santo senhor, eu constantemente te suprirei com uma manga madura,”  e com exercício de seu poder mágico ele o transportou para seu eremitério e pedindo que vivesse lá contente, tirou dele uma promessa e foi embora. Daí em diante o Espírito constantemente o supria com fruto de manga. O asceta, no gozo do fruto, realizou os ritos preparatórios para induzir meditação mística e foi destinado ao mundo de Brahma. 

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          O Mestre, tendo terminado esta lição ao pessoal leigo, revelou as Verdades e identificou o Jataka: - Na conclusão das Verdades, alguns atingiram o Primeiro Caminho, alguns o Segundo e outros o Terceiro Caminho: - “Naquele tempo a deusa era Uppalavanna o asceta era eu mesmo.”